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cascalenses

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O Chafariz de São Francisco e a Porta dos Cavaleiros em Viseu

João Aníbal Henriques, 31.08.16

 

 
 
por João Aníbal Henriques
 
A cidade de Viseu, capital da Beira Alta, é um dos mais extraordinários repositórios de História em Portugal. Em cada canto e esquina, atravessando as ruelas de traçado tortuoso que dão forma ao seu centro histórico, encontram-se os ecos de outros tempos, como se certos espaços da cidade, por artes mágicas vindas sabe-se lá de onde, preservassem de forma sentida as memórias das muitas vidas e das muitas eras que sobre elas se cruzam.
 
Viseu, mercê de tudo isto, alia a modernidade de uma vida já bastante cosmopolita, assente num comércio que sempre foi activo e florescente, com um cunho de tradição que é difícil de encontrar noutros lugares.
 
É o que acontece, por exemplo, com o Chafariz de São Francisco, no início da Rua do Arco, para onde concorrem os desígnios mais profundos de um romantismo que ainda hoje caracteriza a cidade. Em conjunto com a Porta dos Cavaleiros, que é um dos poucos restos da antiga muralha Afonsina, o recanto enche o olhar do visitante com a beleza do trabalho em pedra mas, sobretudo, com as memórias imaginadas por Camilo Castelo Branco que, no seu “Amor de Perdição”, situa ali a cena de pugilato em que Simão Botelho se batia pelo amor de D. Teresa de Albuquerque...
 
 
 
 
De facto, construído no Século XVIII, aproveitando um manancial natural que por ali existia, o chafariz utiliza a formulação estética barroca e entrega-se à cidade sob a égide sagrada de São Francisco, opondo a singeleza da devoção deste santo, à opulência quase majestática que caracteriza este espaço. Compondo-se como se fosse uma espécie de cenário, no qual o chafariz nada mais é o que o fundo de palco no qual brilham os restos antigos da velha muralha com a sua porta histórica e o palacete beirão dos Albuquerques, a fonte aproveita o espaço de uma estrutura anterior que terá sido demolida por António de Albuquerque, o seu construtor.
 
Relativamente à porta, é um dos últimos vestígios da medievalidade viseense, tendo resultado de um dos derradeiros esforços de amuralhamento para protecção da cidade. Digna de um realce especial, é a lápide existente no exterior da velha porta, dando conta da devoção do Rei Dom João IV a Nossa Senhora da Conceição (muitos anos antes de o dogma ter sido aceite pela Santa Sé, em 1854), em linha com uma tradição popular antiga que considera Nossa Senhora da Conceição como Rainha de Portugal. A Senhora da Conceição, ritualisticamente cultuada no território Nacional desde antes da fundação da nacionalidade, é provavelmente o resultado da aculturação das velhas crenças pagãs, cruzadas sobre uma enorme amálgama de pressupostos que resultam das vicissitudes do devir histórico, resultando aqui, neste recanto de Viseu, como uma espécie de eixo estrutural de uma Fé que é transversal em termos políticos e sociais a todos aqueles que vivem no País, e que conjuga, agregando vontades, o todo Nacional a partir de um elemento devocional que todos aceitam como peça essencial da existência de Portugal.
 
Em Viseu, o Chafariz de São Francisco e a Porta dos Cavaleiros, compõem um todo turístico que valoriza a cidade, principalmente se interpretados a partir da sua integração na riquíssima história local.