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cascalenses

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A Rainha Dona Maria Pia em Cascais no dia 5 de Outubro de 1863

João Aníbal Henriques, 27.09.24

 

por João Aníbal Henriques

O dia 5 de Outubro de 1863 foi de festa em Cascais. Com pompa e circunstância, a baía encheu-se de salvas e vivas para receber a Princesa Dona Maria Pia de Sabóia que chegava nesse dia a Portugal para casar com o Rei Dom Luís I.

A vila, engalanada com as cores da Casa de Bragança, foi assim a primeira terra de Portugal a conhecer a futura rainha, mal sabendo ainda o quão importante ela haveria de ser para afirmar Cascais como a “Vila da Corte”, transformando-a com o seu requinte italiano no mais charmoso de todos os destinos em Portugal.

Em 1863 a então Princesa de Sabóia, com a frescura dos seus 15 anos de idade, chegou a bordo da corveta portuguesa Bartolomeu Dias, comandada por Francisco Soares Franco,  e transmitia a todos os que a rodearam o sentimento de esperança que trazia para o seu casamento real.

 

 

 

Mal sabia que, depois de uma vida de enganos e desenganos com o monarca seu marido, haveria de assistir à terrível morte de um filho e de um neto, sendo ela própria expulsa de Portugal.

Para além deste imenso desgosto, do qual nunca mais recuperou,  a Rainha Dona Maria Pia sofreu em Cascais um dos mais tenebrosos momentos da sua vida. Apesar das crises imensas que afectavam o casamento real, a rainha acompanhou o rei a Cascais quando este, já doente terminal, decidiu que queria morrer a olhar para as muito amadas águas da nossa baía. E não descansou quando, hora após hora, cuidou do seu marido ao longo da longa agonia que este haveria de sofrer na Cidadela Real.

O desgosto e o sofrimento foram tão grandes que depois da morte do rei decidiu que não queria voltar a entrar no Paço de Cascais. Esse espaço que se lhe tinha tornado maldito foi substituído pelo Chalet que havia adquirido no Monte Estoril e que partir desse momento passará a ser o sítio privilegiado para a reunião com os seus familiares e amigos numa espécie de corte secundária sempre que vinha a Cascais acompanhar a Família Real.

 

 

Quando morreu exilada em Itália, Dona Maria Pia pediu para ser sepultada com o rosto virado na direcção de Portugal, o país que apesar de tanto mal lhe ter infligido, era efectivamente a sua casa à qual devotadamente entregava o coração e a alma num gesto de amor que nunca foi reconhecido devidamente em Portugal.

Portugal deve muito a esta rainha e Cascais deve quase tudo o que fez deste lugar um sítio tão especial!

O Mito do Pelourinho de Cascais em 24 de Julho de 1833

João Aníbal Henriques, 24.07.24
 
 

por João Aníbal Henriques

Diz a voz popular, repetida incansavelmente há muitas gerações, que o Pelourinho de Cascais está situado em frente à lota, com vista privilegiada sobre a nossa extraordinária baía.

Mas não é verdade. O Pelourinho Medieval de Cascais, que a documentação atesta ter existido junto à ponte que ligava as duas margens da Ribeira da Vinhas, terá sido completamente destruído pelo grande terramoto de 1755.

O padrão colocado junto à baía, a que tantos aludem como sendo o dito pelourinho, é um marco comemorativo de um dos mais sanguinários e destruidores momentos da História de Portugal: a luta fratricida entre Dom Pedro e Dom Miguel e a mortífera Guerra Civil que opôs liberais a absolutistas depois da morte de Dom João VI.

No dia 24 de Julho de 1833, liderando um exército formado com o apoio da Coroa Inglesa, que tinha vastíssimos interesses na independência de Portugal e no estabelecimento de um regime liberal que satisfizesse as suas necessidades no controle das rotas comerciais com a Ásia, com África e, sobretudo, com o Brasil, entra em Lisboa o Duque da Terceira, desferindo sobre os partidários do Rei Dom Miguel I um duro golpe que pôs fim à Guerra Civil.

Dom Pedro IV, primeiro imperador do Brasil e mítico autor do célebre Grito do Ipiranga, que tornou a antiga colónia portuguesa num país independente, decide abdicar da Coroa Portuguesa na pessoa da sua filha mais velha, assumindo a liderança da Casa de Bragança e regressando a Lisboa como Regente do Reino de Portugal, deixando o seu filho Dom Pedro II como Imperador do Brasil.

A entrada triunfal da Rainha Dona Maria II em Lisboa, depois do êxito de 24 de Julho de 1833, marca o início de um novo período da vida política de Portugal, uma vez que a jovem rainha, que passara uma parte importante da sua infância em Inglaterra, mantém uma ligação de profunda afeição e amizade com a futura Rainha Vitória, fortalecendo assim uma aliança que ainda hoje tem consequências diversas na política externa portuguesa e nos equilíbrios políticos de Portugal nesta Europa escalavrada em que vivemos.

O marco ao qual os Cascalenses chamam erradamente “pelourinho”, é assim um monumento que festeja a vitória liberal e a subida ao trono da Rainha Dona Maria II de Portugal!

Dom Fuas Roupinho no Castelo de Porto de Mós

João Aníbal Henriques, 13.02.17

 

 
 
por João Aníbal Henriques
 
Ao contrário do que é comum afirmar-se, a matemática nem sempre produz resultados absolutos. Por vezes, a soma de duas partes não origina a multiplicação linear do resultado, antes desenvolvendo um factor potenciador que reforça o carácter inesperado desse mesmo resultado...
 
É o acontece na Cidade de Porto de Mós, na Região Centro de Portugal, onde o horizonte surge bem vincado pelo perfil inesperado do seu castelo. Tendo ficado a história da sua origem definitivamente perdida no tempo, até porque não se conhece com exactidão a data que marca a construção da estrutura actual, o Castelo de Porto de Mós ocupa um local estrategicamente essencial para a defesa da povoação circundante e de todo o território Nacional. Antes dele, existiria no mesmo sítio uma antiga fortificação de origem árabe, que foi conquistada logo em 1148 pelos exércitos chefiados por Dom Afonso Henriques, e que, por seu turno, veio sobrepor-se a uma estrutura anterior, provavelmente remontando ainda ao período neolítico.
 
 
 
 
O castelo que hoje ali vemos, cuja base estrutural foi definida durante o reinado de Dom Sancho I, é o resultado da soma de diversos contributos de várias civilizações que nos antecederam e, também, de vários estilos arquitectónicos e artísticos. Mas, tal como acontece com a matemática, a soma de todos estes contributos é amplamente maior do que cada uma das partes que o compõem…
 
Reza a lenda que o Castelo de Porto de Mós foi entregue, logo em 1148, ao ilustre fidalgo Dom Fuas Roupinho. Desconhecido documentalmente (ainda) o fidalgo Português foi um dos principais conselheiros do fundador da Nacionalidade, tendo simultaneamente assumido o papel de primeiro Almirante da Esquadra Portuguesa. Fernão Gonçalves Churrichão de seu nome verdadeiro, entrou na História devido à sua participação no denominado ‘Milagre da Nazaré’, consolidando o prestígio e o poder que já detinha por ter sido membro activo e importante da Ordem dos Cavaleiros do Santo Sepulcro, ou seja, dos Cavaleiros Templários.
 
Quando caçava na Nazaré, durante o período em que assumiu funções como Senhor de Porto de Mós, Dom Fuas Ropuinho terá sido envolvido por uma espessa cortina de nevoeiro que, toldando a sua vista, o impediu de perceber que cavalgava de forma intrépida em direcção ao precipício que exista junto às falésias. Ao dar conta da desgraça eminente, e ao perceber que estava num local muito próximo da uma gruta onde se venerava uma imagem de Nossa Senhora, terá pedido a sua ajuda e intervenção que foi imediatamente concedida. A Virgem fez estancar o cavalo à beira do precipício, onde deixou uma marca bem visível na rocha, evitando a morte certa do fidalgo Português. A devoção que desenvolveu por essa imagem, bem como a Fé profunda que tinha no seu poder junto da sua própria vida, fez com que ali mandasse construir uma capela dedicada a Nossa Senhora da Nazaré, que se situa precisamente sobre a velha gruta onde o cavalo foi mandado parar pela mãe de Jesus.
 
O veado que Dom Fuas caçava naquele importante dia da sua vida enquanto Senhor de Porto de Mós, é interpretado em termos simbólicos como sendo a própria figura do Demo, num impulso de tentação com o qual terá tentado destruir o piedoso Templário. É, por isso, uma luta prolixa entre o bem e o mal aquilo que trata esta lenda, cujas reminiscências mais profundas, perdidas provavelmente para sempre no devir histórico de Portugal, alavancam a lei dos contrastes que explica e enriquece a Identidade Nacional.
 
 
 
É, por isso, num cenário miraculoso que o Cavaleiro Templário faz nascer a sua lenda e é sobre ela, assente num imaginário colectivo que carrega consigo velhas tradições ancestrais, que Dom Fuas Roupinho dá corpo ao mais profundo, significante e importante legado que corporiza a formação da Nacionalidade, resgatando das profundezas das antigas tradições da sabedoria a chama com a qual aquece o caldeirão alquímico sobre o qual se construiu Portugal. De facto, o novo País nasce em ligação estreita e profunda com o ideário mariano de matriz Cristã. Mas, na sequência daquilo que foi a cristianização do actual território Nacional, grande parte dos valores, doutrinas e ritualísticas associados à nova práxis religiosa, são afinal resultado da evolução natural de várias ideias arquétipas que, mesmo sendo Pré-Cristãs, integram em si precisamente os mesmos princípios que hão-de orientar o surgimento da mais revolucionária das religiões Ocidentais. Entre o Cristianismo e as religiões que o antecederam, tal como entre o Castelo de Porto de Mós e as fortificações e construções que antes dele ali existiram, existe uma linearidade evolutiva que ao contrário do que é comum dizer-se, pautou-se pelo respeito e pela confiança, num cenário de evolução no qual a palavra cisão não fazia qualquer sentido.
 
A soma das partes, também na vida de Dom Fuas é maior do que as partes em si próprias, fomentando um potencial de significado que transcende largamente a história da sua própria vida.
 
No caso de Porto de Mós, diz a lenda que Dom Fuas Roupinho não teve tarefa fácil. Depois de receber o encargo de defender a localidade de eventuais investidas inimigas, não conseguiu evitar que os exércitos muçulmanos viessem a recuperar o domínio da sua fortificação. Mas ele, provavelmente fazendo uso dos conhecimento que detinha pela sua condição de Cavaleiro Templário, terá encontrado um estratagema que lhe permitiu recuperar a praça pouco tempo depois do malogrado acontecimento, num laivo miraculoso cujos ecos perduram ao longo do tempo…
 
 
 
Em termos estruturais, o Castelo de Porto de Mós que hoje vemos já pouco tem a ver com a estrutura medieval inicial. Sucessivas campanhas de obras, que assumem o cenário idílico onde o mesmo se ergue, com vista sobre a serra e o Vale do Lena, vão progressivamente retirando à edificação a sua carga militar e transformando o velho castelo num magnífico palácio onde se privilegiava a apreciação das artes e das letras. A sua fachada actual, com os torreões cobertos de telha verde que se transformou no ex-libris da localidade, foi construída no Século XV pelo 4º Conde de Ourém, filho dos primeiros Duques de Bragança. E é novamente nessa ligação quase genética ao imaginário Nacional, que Porto de Mós recupera o carácter vincado da sua importância simbólica e a originalidade de uma existência onde a lenda se volta a misturar com a realidade.
 
Isto porque, em 1385, Porto de Mós tomou partido pelo Mestre de Avis. E, em consequência disso, foi ali que estiveram aquarteladas as tropas nacionais nas vésperas de seguirem para Aljubarrota, onde por intercessão de Nossa Senhora, e sob a orientação estratégica de Dom Nun’Álvares Pereira, alcançaram uma das mais significantes vitórias militares em toda a História de Portugal. Por reconhecimento ao seu Condestável, o novo Rei Dom João I, simultaneamente Mestre de Avis e pai da Ínclita Geração que haveria de dar novos mundos ao Mundo e oferecer a Portugal a sua vocação hermética, oferece Porto de Mós a Nun’Álvares Pereira que ele, enquanto Grande-Construtor de universos, lega por seu turno à sua filha e genro, precisamente os primeiros Duques de Bragança. Mantém-se visível e actuante, desta maneira, a consagração de Porto de Mós à mais profunda tradição iniciática de Portugal, reconvertendo a sua linha de cenário num objecto pleno de importância para quem quiser compreender verdadeiramente a razão de ser da própria existência deste País sem igual.
 
 
 
 
O sinal marcante deste processo de consolidação estrutural surge perfeitamente identificado com a Cruz de Cristo e, por isso, com a própria Alma de Portugal. É ela que encabeça o esforço inicial de Roupinho na sua faceta Templária e é ela também quem surge enfunada nas velas que movem as naus que farão os Descobrimentos de Portugal. Diferente da latina, a Cruz de Portugal que se corporiza em Porto de Mós é praticamente a mesma que marca o ‘Centro do Universo’ na milenar Cidade Proibida de Pequim, da mesma forma que é semelhante em termos físicos e de significado, às cruzes Coptas pré-Cristãs que se encontraram na antiga Abissínia.
 
Depois de ter sido bastante destruído pelo grande terramoto de 1755, o Castelo de Porto de Mós foi sucessivamente alvo de várias campanhas de obras que consolidaram a sua vocação palaciana.
 
Actualmente, numa cenografia arquitectónica definida pelo apelo à beleza e à arte, Porto de Mós é uma espécie de capital espiritual de Portugal. O seu castelo, outrora essencial para defender militarmente a independência do País, defende agora (e é essencial) a própria Alma de Portugal.
 

 

O Castelo de Portel Mafomede no Alentejo

João Aníbal Henriques, 06.01.17

 

 
 
por João Aníbal Henriques
 
Assumindo a sua posição altaneira relativamente à bonita vila de Portel, no Alentejo, o Castelo de Portel é um dos mais extraordinários vestígios da origem cultural de Portugal e da ligação profunda e arreigada às tradições ancestrais que deram forma aos mais importantes arquétipos da humanidade.
 
Não se conhecendo de forma documental a sua verdadeira origem, é crível que antes do início da construção da actual edificação, ali existisse já uma fortificação anterior, provavelmente de origem muçulmana, que daria corpo ao sustento da população que vivia naquele espaço. Na documentação coeva da sua construção, a Casa Real Portuguesa denomina a vila como ‘Portel Mafomede’, numa prática toponímica que aponta para uma pré-existência islâmica cuja origem não será diferente daquela que noutras zonas do actual território nacional terá conduzido à aculturação que forma a Identidade Nacional.
 
A atribuição toponímica de Portel a Mafomede, curiosa se pensarmos que a diabolização da expressão resulta do processo de extinção da Ordem dos Cavaleiros Templários, assume foros de grande importância quando nos debruçamos sobe a origem do castelo. Em primeiro lugar porque, como se sabe actualmente, a figura da Mafomede ou Bafomet, representa basicamente as três formas de expressão primordiais da matéria. No Convento de Cristo, em Tomar, a figura de Hermes Trismegisto é representada numa das pedras angulares da edificação representada como Bafomet com as suas três faces reinantes. Depois, porque a divinização trina que Bafomet compõe, juntando num mesmo plano as diversas faces que apresenta Deus na sua expressão simbólica de eixo estrutural da humanidade, uma reposição dos antigos cultos pagãos de origem Grega que, compondo o seu corpo de saber sobre os rituais ancestrais que acompanharão a evolução humana na bacia do Mediterrâneo, nos levam até à figura do Deus Pã, complexão estática do sopro deífico que dá forma lendária à origem de muitas das mais importantes povoações de Portugal.
 
 
 
 
No Grego antigo, por exemplo, a expressão Baph Metis, significa literalmente o “baptismo da sabedoria”, sabendo-se ainda que a mesma expressão em hebraico, utilizando a codificação cabalística, significa Sophia, ou sabedoria…
 
Em qualquer dos casos, o Portel que hoje temos, foi outrora o Portel Mafomede, num fluxo generalizado de saber oculto, que determinou o processo de reconquista Cristã em que se insere a construção do castelo actual e, mais importante ainda, a definição dos equilíbrios político-administrativos no recém-criado Reino de Portugal.
 
 
 
 
De facto, quando em 1257 o Rei Dom Afonso III entregou a João de Aboim as terras de Portel Mafomede, determinando o início da construção do castelo e retirando-as ao Termo de Évora, o que está em causa é a preservação do controle político deste importante território. Para além de impor uma dinâmica concertada no que concerne ao processo de reconquista, a doação e posterior construção da estrutura amuralhada reforçam ainda o poder político pessoal do novo rei, depois da conturbação política que ditou o afastamento do seu irmão, o anterior Rei Dom Sancho II. Portel surge assim como axioma de referência, na definição daquela que virá a ser a intervenção política da Casa Reinante, e que durará até ao fim da Primeira Dinastia, em 1385.
 
João Peres de Aboim, de origens minhotas e filho do senescal do Rei Dom Sancho II, é apresentado na documentação ceva como “um fidalgo violento e insaciável que saqueava sem mercê os bens dos municípios e dos seus moradores”. A sua proximidade ao infante Dom Afonso, com o qual ruma a França onde preparam a revolução que ditará a subida ao trono deste, acabará por granjear-lhe um poder sem igual, que manterá mesmo depois da morte do rei e durante todo o período em que durou o reinado de Dom Dinis.
 
As obras do castelo de Portel, prolongaram-se também ao longo das décadas seguintes, acompanhando a mudança radical introduzida em Portugal pelo Rei Trovador, sempre acompanhado de perto por João de Aboim que preserva as honras inerentes a facto de ter sido Mordomo-Mor do Reino.
 
 
 
 
O rei Dom Dinis, o alquimista assumido que planta as naus que desde Leiria darão novos mundos ao Mundo, é assim o verdadeiro Hermes Trismegisto de Portel, consagrando nas suas três faces de político, poeta e mágico a apetência para transformar aquele espaço na referência primária da consolidação do cristianismo herético da Ordem de Cristo, na pedra angular da Identidade Nacional. Não é por acaso que, quando Mafomede é utilizado como argumento no julgamento que ditará a extinção dos Templários, dizendo-se que representa um culto satânico de cujo poder depende o sucesso militar e religioso da ordem liderada por Jacques de Molay, em Portugal é o Rei Dom Dinis que contorna as directivas papais criando a nova Ordem de Cristo para a qual transitam os bens templários existentes em Portugal e, possivelmente, os próprios directores espirituais da antiga ordem.
 
De qualquer maneira, depois da morte do Rei Dom Dinis e do construtor do castelo, a contenda jurídica que envolve os seus herdeiros acaba por decidir a recuperação da propriedade por parte do Estado e, em 1384, a sua entrega ao Condestável de Portugal, Dom Nuno Álvares Pereira, que junta as terras de Mafomede ao património do que há-de vir a ser a Casa de Bragança.
 
O Santo Condestável, nessa altura já transformado em Frei Nuno de Santa Maria, obreiro da magnitude enorme da Ínclita Geração e concretizador do projecto alquímico plantado pelo Rei Dom Dinis, trabalha sob o signo da flor-de-lis, sob a tutela de Dom João I, o Mestre de Avis, transformando Portel num verdadeiro caldeirão alquímico no qual tudo pode acontecer. A mítica transmutação da matéria, epíteto maior que resulta da posse do segredo da pedra filosofal, conduz no recato de Portel à transmutação das almas. Mafomede, com as suas três faces, nada mais é do que o simbólico arquétipo da Santíssima Trindade, consolidando pelo verbo do Pai e o pão que se transforma em carne, do seu Filho, a força maior transformadora que concebe o Espírito-Santo. E este, por seu turno, subvertendo a realidade e condecorando como Rei o mais humilde dos seus servos. Como se vida e morte fosse uma realidade só!
 
 
 
 
Depois de perdida a sua utilidade militar, o Castelo de Portel foi entrando num paulatino processo de ruína que culminou, já no início do Século XX, com as primeiras campanhas de reconstrução que o dotaram do aspecto actual.
 
Durante a vigência do Estado Novo, num processo conduzido pela então Direcção Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais, foi recuperada a sua vocação romântica, introduzindo-lhe uma cortina de ameias que, em conjunto com a adaptação da sua Torre de Menagem, lhe alteraram a estrutura e o adaptaram à vocação turística que então se assumiu para Portugal.
O Castelo de Portel, pleno de potencial turístico e cultural, está hoje aquém daquilo que poderia ser na definição da memória colectiva do Alentejo e de Portugal. A sua importância efectiva e o simbolismo que agrega, fazem dele uma peça essencial para se perceber quais são os desígnios nacionais e a forma como nestas paragens se encontram os resquícios mais profundos da nossa Identidade Nacional. 
 
Pode ser que um dia alguém se dedique novamente a este recanto tão especial de Portugal.