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cascalenses

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Cinismo Verde em Portugal

João Aníbal Henriques, 16.01.15

 

 
 
por João Aníbal Henriques

 

O ano de 2015 inicia-se em Portugal com uma tresloucada apetência pelas preocupações ambientais… num acto de desvario que resulta do cruzamento sempre complexo entre as necessidades eleitorais e as que resultam da crónica falta de dinheiro, o estado e as autarquias de diversas sensibilidades políticas e partidárias convergem numa pseudo-defesa intransigente dos interesses ambientais de Portugal, utilizando essa máxima descabida para esconder as reais motivações que estão por detrás da decisões que vão tomando para defender os seus interesses particulares.
 
A primeira destas medidas foi a da chamada “política dos sacos”. Concretizada pela coligação governativa formada pelo PSD e pelo CDS, pretende cobrar-se um imposto que adjectivam como “verde” sobre cada saco de plástico utilizado em Portugal. Dizem eles (e têm razão) que o plástico utilizado nos ditos sacos é imensamente poluente e que, com este imposto, Portugal conseguirá reduzir drasticamente o impacto negativo que tem nesta área.
 
Mas dizem também, sem nenhuma vergonha, que a política dos sacos resulta em primeira instância da necessidade de colmatar o défice orçamental imposto pelo chumbo das propostas orçamentais pelo Tribunal Constitucional. Em suma, se não houvesse este conjunto de constrangimentos orçamentais, o governo pouco se importaria com o impacto dos sacos no ambiente e jamais lhe passaria pela cabeça a criação deste imposto cinicamente “verde”!
 
Em linha com este exercício hipócrita, e novamente ao sabor do eleitoralismo que dará forma a 2015, a câmara socialista de Lisboa veio mostrar-se preocupada com o ambiente no centro da cidade (no resto da cidade não importa nada a poluição…) e impôs restrições à circulação automóvel em algumas zonas da cidade.
 
E tem razão para se mostrar preocupada. A poluição provocada pelo trânsito automóvel é enorme e precisamos urgentemente de criar medidas que libertem as nossas cidades deste flagelo.
 
Mas, no caso específico de Lisboa, a hipocrisia dá forma a mais esta medida hipocritamente “verde”. Ao estabelecer uma idades para definir os carros que podem, ou não, circular na cidade, a edilidade assumiu que os critérios para essa circulação não são o grau de poluição provocado pelos veículos, mas sim uma cínica balança entre os votos dos quais necessitam os partidos que estão no poder, e o politicamente correcto que desde sempre se associa ao ambiente.
 
Senão vejamos: um Opel Corsa B, adquirido novo em 1997, com uma cilindrada de 1200 cm3, emite 156 g/km de CO2 e está proibido de circular em grande parte da cidade de Lisboa. Mas, por exemplo, um BMW 550D, adquirido novo em 2014 e com um índice de emissões na ordem dos 166 g/km de CO2, mais elevado do que a do velhinho Opel Corsa, pode circular livremente! 

A Igreja de São Paulo em Lisboa

João Aníbal Henriques, 06.08.14

 

 

por João Aníbal Henriques

 

Construída depois da destruição que resultou do grande terramoto de 1755, que provocou um posterior maremoto que literalmente varreu toda a zona ribeirinha da cidade, a Igreja de São Paulo situa-se na praça com o mesmo nome, junto ao Cais do Sodré e nas traseiras do Mercado da Ribeira.

 

O edifício actual veio ocupar o espaço de uma antiga ermida, de dimensões consideráveis que são visíveis nas antigas figuras que mostram a cidade de Lisboa, que existia no mesmo local e que foi destruída pelo sismo. De acordo com as fontes, a ermida mais antiga seria datável da época da formação da nacionalidade, sendo que o edifício que desapareceu no Século XVIII dataria de 1412, data que constava de uma lápide em latim colocada na fachada do templo original e que marcou a fundação da respectiva Paróquia de São Paulo, situada na antiga Travessa do Carvão.

 

Depois do cataclismo, toda aquela zona beneficiou da protecção directa do Marquês de Pombal, proprietário de muitos edifícios nas redondezas, que acelerou o processo reconstrutivo e facilitou a integração de vários elementos qualificadores naquela parte da cidade. A ligação ao estadista é ainda hoje visível na toponímia local, na qual o apelido ‘Carvalho’ surge amiúde.

 

Ainda em 1771, o então Primeiro-Ministro inaugura ali mesmo ao lado um importante mercado, a “Ribeira Nova”, ao mesmo tempo que por sua iniciativa são aproveitadas as águas termais de uma nascente situada a Sul da igreja e que foi posteriormente foram transformadas nos “Banhos de São Paulo”.

 

 

 

 

É ainda do tempo do Marquês de Pombal  o projecto de construção de um chafariz público que, apesar dos seus esforços, só foi inaugurado em 1849. Curioso é o facto de a bica virada para a fachada da igreja ter ficado reservada desde logo às gentes ligadas ao mar.

 

 

 

Em termos arquitectónicos, a nova igreja inspira-se no modelo utilizado no Convento de Mafra, sendo o projecto original da autoria do Arquitecto Remígio Francisco de Abreu, assistente de Eugénio dos Santos, decalcando os valores em voga na época e em linha com as directrizes que deram forma à reconstrução da Baixa Pombalina.

 

Na sua formulação espacial, a igreja actual inverte a orientação do templo destruído em 1755, abrindo a sua fachada principal para Nascente, na actual Praça de São Paulo, e dando corpo a um dos mais aconchegantes e bonitos recantos de Lisboa.

 

Com uma só nave, rodeada por oito pequenas capelas laterais, o templo caracteriza-se por uma bonita capela-mor decorada por pinturas da autoria de Joaquim Manuel da Rocha, que contrasta com o mármore que dá forma às colunas que suportam a estrutura principal. Digno de referência é ainda o baptistério situado junto à entrada, da autoria do pinto Pedro Alexandrino.

 

Apesar da sua beleza e do charme que envolve todo o local, um estado de abandono latente e de grande desleixo é hoje a principal característica deste espaço tão especial. Com uma situação geográfica extraordinária, a poucos metros do cada vez mais afamado Cais do Sodré, da renovada frente ribeirinha do Tejo e do empreendedor projecto da Praça da Ribeira, é uma pena que Lisboa não aproveite condignamente um local assim.

 

 

 

A Igreja de Santos-o-Velho em Lisboa

João Aníbal Henriques, 06.12.13

 

por João Aníbal Henriques

Envolvida por lendas, estórias e muitos mistérios, a Igreja de Santos-o-Velho, em Lisboa, é provavelmente um dos mais extraordinários e interessantes recantos da cidade. Situada no final da Rua das Janelas Verdes, junto à Lapa, o templo assume uma privilegiada posição sobre o Rio Tejo, marcando de forma definitiva a antiga entrada de Lisboa.

Fazendo jus ao seu nome e sublinhando a antiguidade da sua longa História, a igreja possui na fachada principal um baixo-relevo com as figuras de três mártires-crianças do Cristianismo, Veríssimo, Júlia e Máxima que, segundo reza a lenda, terão sido condenados à morte no ano de 308 pelo poder político Romano.


O templo original, construído sobre o túmulo dos mártires, serviu para tornar perene na memória de quem por ali passa, a Fé extraordinária destas três antigas crianças lisboetas e foi erigido no período tardo-romano, em pleno Século IV. Destruído posteriormente, possivelmente durante a ocupação Muçulmana da Península Ibérica, foi reconstruído depois da Conquista de Lisboa, em 1147, por Dom Afonso Henriques. O seu filho, Dom Sancho I, ter-lhe-á dado uma nova dignidade, aumentando o templo, elevando-o à condição de igreja e juntando-lhe o edifício do convento, onde hoje funciona a Embaixada de França.  

A sua forma actual, no entanto, resulta de intervenções efectuadas no Século XVII, pelo Arquitecto João Antunes, que lhe acrescentou o típico frontispício que ainda hoje se vê, e que tapa a antiga fachada da igreja medieval. Foi também nesta altura que lhe foram acrescentados os torreões que dão forma à fachada actual.

No Século XIX, novas intervenções de fundo, com o acrescento da Capela-Mor, construída depois da doação do terreno pelos Marqueses de Abrantes, vieram complementar a grandeza do templo que definitivamente se transformou num dos principais locais de culto da Cidade de Lisboa.

O convento, entretanto entregue à Ordem de Santiago, foi também espaço de relevo em diversos momentos da nossa História, tendo ficado indelevelmente ligado à desgraçada saga Nacional de 1578, quando pela mão do Rei Dom Sebastião, Portugal se perdeu na Batalha de Alcácer Quibir.

Diz ainda a lenda que o rei, que muito gostava de passar temporadas neste espaço, ali ouviu Missa pela última vez antes de embargar para a sua derradeira viagem e que terá sido ali mesmo, algum tempo antes, que terá tomado a decisão que acabou por resultar na perda da independência de Portugal.

Tendo sido vendido posteriormente à família Lencastre, o antigo convento e a igreja foram revendidos ao Estado Francês já no Século XX, ali funcionando a dependência diplomática daquele País.
Aberta ao público a Igreja Paroquial de Santos-o-Velho é um dos espaços que merece uma visita atenta na Cidade de Lisboa. Para além do túmulo da Família Abrantes que ali descansa como contrapartida da oferta do terreno onde se construiu a Capela-Mor, importa ver também o túmulo das crianças-mártires e a impactante nave central.

 

Mescla de estórias e de História, a Igreja de Santos-o-Velho é um repositório inesquecível da História de Lisboa, carregando uma patine antiga que deriva da sua participação directa nos principais acontecimentos da História de Portugal.