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José Dias Valente e Helena Quina: uma Homenagem ao Futuro do Monte Estoril

João Aníbal Henriques, 23.09.24
 

 

por João Aníbal Henriques

Cruzaram-se os tempos na homenagem sentida que a Junta de Freguesia de Cascais-Estoril e a Câmara Municipal de Cascais fizeram ao Professor e Pedagogo José Dias Valente e à Pintora Maria Helena Quina em conjunto com a Associação dos Antigos Alunos do Colégio João de Deus.

O mote, sublinhado pelo Vice-Presidente da CMC, Nuno Piteira Lopes, no discurso que acompanhou o descerramento do retrato inaugurado na galeria de notáveis da freguesia, foi colocado nos tempos que hão-de vir, numa alusão apelo directo à importância que o exemplo de excelência dos que nos precederam neste espaço tem para a formação do nosso futuro comunitário.

 

 

O trabalho extraordinário de José Dias Valente na liderança do Colégio João de Deus, marcando sucessivas gerações e oferecendo a Portugal a oportunidade de singrar no futuro recuperando os principais valores da nossa identidade, foi perpectuado pelo traço e a sensibilidade de Maria Helena Quina, e será a partir de agora um marco identitário que ajudará reforçar a importância do seu legado para a formação educativa do Cascais que ainda queremos ter.  

É unânime junto dos antigos alunos a influência que o “Patrão”, como chamavam ao Director Dias Valente, teve nas suas vidas. E é comummente aceite por todos que a passagem pelo Colégio João de Deus marcou toda a comunidade educativa com um traço distintivo que se reconhece facilmente. O respeito e a responsabilidade que José Dias Valente cultivava junto dos seus, e que plasmava na prática pedagógica do seu João de Deus, acompanhava-se sempre de um apelo retumbante à criatividade, à resiliência, e à diferença que todos sabiam que era característica de todos aqueles que por ali passavam.

Nunca houve resignação no Colégio João de Deus. A comunidade educativa, seguindo o exemplo do seu carismático director, sempre se focou nas potencialidades dos seus alunos, reforçando as suas qualidades e utilizando-as como ferramentas para contornar os seus defeitos… fazendo, desta forma, gente forte, com o ímpeto da irreverência que marcou em definitivo as suas vidas e as daqueles que com eles se cruzaram nos caminhos sempre tortuosos das vidas de toda a gente.

 

 

Com esta homenagem, assume-se publicamente que o futuro desta terra terá de se formatar neste seu exemplo, recriando uma dinâmica comunitária onde todos e cada um são essenciais na definição de um futuro congruente.

As flores deixadas junto da sepultura de José Dias Valente simbolizam essa eternidade maior que acompanhou a sua vida, estabelecendo uma ponte entre o seu tempo e o futuro maior que acompanhará a próxima geração de Cascalenses.

Porque uma comunidade sã e responsável vive intensamente as suas origens e os seus alicerces. E a memória de José Dias Valente e Helena Quina é uma efectiva ponte pênsil que a singela homenagem da passada Sexta-feira veio estabelecer como compromisso de excelência para os nossos filhos e netos.

 

 

 

 

 

 

O Colégio João de Deus no Monte Estoril - Oitenta Anos Depois

João Aníbal Henriques, 22.08.16

 

 
por João Aníbal Henriques
 
Em Agosto de 1936, há precisamente 80 anos, terminava o primeiro ano lectivo no Colégio João de Deus, no Monte Estoril. Nascido depois da cisão que marcou o fim do Bairro Escolar do Estoril, fundado em 1928 por João de Deus Ramos, João Soares, Virgílio Vicente da Silva e Mário Pamplona Ramos, o novo estabelecimento de ensino depressa conquistou o prestígio que havia de o acompanhar ao longo de toda a sua história, assente num projecto pedagógico alternativo e inovador delineado pelo pedagogo João de Deus e concretizado pelo pragmático Professor José Dias Valente.
 
 
Professores do Bairro Escolar do Monte Estoril (1935)
 
 
O Colégio João de Deus, que fechou portas em 1970, ainda é hoje pólo aglutinador de vidas e de vontades, reunindo num almoço anual composto por antigos alunos e suas famílias, largas dezenas dos rapazes que durante quase quatro décadas encheram de barulho e de vida os cantos e recantos do Monte Estoril. Por incrível que pareça, mais de quarenta anos depois do seu encerramento, é forte e firme o sentido de pertença que une os antigos alunos ao velho colégio, bem como perenes são as memórias que guardam como testemunho do seu início de vida dentro das paredes do velho colégio estorilense.
 
Quando há 80 anos atrás abriu as suas portas, como consequência de um movimento espontâneo de um conjunto de professores do antigo Bairro Escolar em apoio ao seu mentor João de Deus que tinha optado por sair da antiga sociedade que controlava o projecto educativo do Bairro Escolar, o Colégio João de Deus pretendia recriar o ideário de uma pedagogia nova que acompanharia a recuperação de Portugal. Exigente e cuidada, a prática educativa defendida pelos professores fundadores assentava num apelo permanente à liberdade. Pretendia-se cortar as amarras com a educação enciclopédica e monolítica que até aí tinha sido a referência em Portugal, para dar corpo a uma forma de ensino que compreendia, promovia e apoiava as singularidades de cada um dos seus alunos, fomentando um crescimento em conjunto, como se de uma comunidade quase familiar se tratasse, que permitisse aproveitar de forma eficaz o que de melhor cada um possuía.
 
 
 
Os professores-fundadores do Colégio João de Deus (1936)
 
 
E como os planos raramente se concretizam tal e qual como foram idealizados e a componente aleatória do destino se impõe normalmente aos planos dos homens, o velho projecto imaginado por João de Deus Ramos de criação de uma espécie de campus educativo em terras do Estoril acaba por soçobrar perante a inexorável realidade, criando espaço para o surgimento de uma nova prática que haveria de vingar contornando as vicissitudes e aproveitando os acontecimento pródigos do devir.
 
Depois de concretizados os desaguisados que puseram fim à sociedade educativa do bairro, um grupo de professores dos quais faziam parte Mário Pamplona Ramos, Augusto Mimoso, Henrique Perestrelo de Alarcão, Álvaro Themudo, Armando Lucena, Aníbal Henriques, Rubi Marques e José Guerreiro, tomou a iniciativa de concretizar o projecto educativo do seu mestre num espaço alternativo que projectaram construir.
 
 
 
Primeiro número do boletim "Nós Queremos" do Colégio João de Deus (1937)
 
 
Mas nem tudo foi fácil para este grupo de revolucionários pois, por motivos eminentemente pessoais, e também pelo cansaço que derivava de uma longa dedicada à escola e à educação, João de Deus Ramos não aceitou encabeçar o novo projecto obrigando os promotores a encontrarem alguém com a capacidade e com a disponibilidade para o fazer. E, dando espaço ao destino, a escolha recaiu sobre um lisboeta com experiência no ensino e com vontade e os meios necessários para liderar o novo projecto. Antigo colega da Faculdade de Letras de Aníbal Henriques e Freitas e Silva, com os quais tinha mantido laços fortes de amizade, José Dias Valente é assim convidado para vir dirigir o novo colégio, cargo que vai ocupar até ao seu encerramento definitivo em 1970.
 
 
 
José Dias Valente e Aníbal Henriques na cerimónia dos 25 anos do Colégio João de Deus
 
 
José Dias Valente (1902-1977), eminente professor e pedagogo, chega assim ao Estoril onde vai da forma ao mais conseguido dos projectos educativos concretizados em Cascais. Ao longo dos 35 anos em que dirigiu o Colégio João de Deus, Dias Valente transformou literalmente a vida de milhares de Portugueses, tendo deixado uma herança de sabedoria que perdura ao longo dos anos e que tanta importância teve na concretização do Portugal moderno em que hoje vivemos.
 
Oitenta anos depois do início daquela aventura educativa, quando ainda estão vivos muitos daqueles que penhoradamente assumem ter sido o Colégio João de Deus o cadinho que lhes formou o carácter e os preparou para a vida, importa homenagear José Dias Valente e todos aqueles que com ele tiveram a coragem de concretizar um projecto assim.