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cascalenses

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Os Bolsos da Dívida Grega

João Aníbal Henriques, 21.07.15

 

 
 
Adiando com a barriga aquele que é o mais grave problema estrutural da União Europeia e garantindo que no permeio todos ficam bem na fotografia e aptos a enfrentar mais uma ronda de eleições internas, o Mecanismo Europeu de Estabilização Financeira, ou seja, o Banco Central Europeu, o FMI e a própria União Europeia, anunciaram com pompa e circunstância um empréstimo extraordinário de emergência à Grécia de mais de sete mil milhões de Euros.
 
E depois, como se de nada soubessem, os mesmos FMI e Banco Central Europeu, em momento diferentes para fazer render o espectáculo e os dividendos propagandísticos da sua acção, anunciaram que a Grécia havia liquidado as suas dívidas e os respectivos juros e que, por isso, estavam disponíveis para analisar um novo resgate àquele país helénico.
 
Esqueceram-se de explicar aos incautos Europeus, que o pagamento das ditas dívidas foi feito com o tal empréstimo de emergência concedido na véspera… ou seja, o dinheiro entrou no bolso esquerdo da Grécia e, horas depois, saiu pelo direito!
 
Atente-se: ao BCE a Grécia pagou 3,5 mil milhões de euros de empréstimos anteriores, aos quais acresceram mais 700 milhões em juros! E ao FMI, pagou mais 2 mil milhões de euros, aos quais juntou mais uns tantos milhões pagos ao Banco Central da Grécia.
 
Na prática, o que aconteceu foi que a Grécia recebeu mais um novo empréstimo virtual e fictício das instâncias internacionais, pelo qual pagou muito mais caro do que por qualquer dos anteriores (note-se que até a carne e o papel higiénico passaram a ser taxados com a taxa máxima do IVA) que imediatamente devolveu aos credores. Na perspectiva inversa, os credores entregaram à Grécia 7 mil milhões de euros que voltaram a receber logo de seguida, acrescidos de juros e de novas condições duríssimas a que uma vez mais fica sujeito o povo grego…
 
Os bolsos da Grécia e dos Gregos, esses continuam vazios. Mas algures depois da leva de eleições que aí vem, há-de chegar a data para um novo pagamento que o País não vai conseguir fazer, porque tem a economia condicionada externamente pelos seus credores e fica total e completamente impossibilitado de crescer. E nessa altura, para terror de todos nós, vamos voltar a ver este mesmo filme.
 
Que tristeza de Europa esta!

 

 

Uma Tragédia Grega numa Europa Trágica?

João Aníbal Henriques, 18.06.15

 

 
 
Possivelmente decidir-se-á hoje o impasse relacionado com a resolução do problema estrutural da Grécia e da sua dívida europeia. O desenlace, depois do imbróglio demasiado longo que se foi arrastando ao longo dos últimos cinco anos, terá pouco de apoteótico… aconteça o que acontecer, mesmo que a Grécia decida aceitar as novas condições impostas pela Europa para preservar a sua continuidade na zona Euro ou que a Europa se mantenha firma nas suas exigências e expulse a Grécia do seu seio, o mal está feito e a única certeza que existe é que mais do que uma tragédia grega, o resultado vai ser uma terrível tragédia Europeia.
 
Em primeiro lugar porque ficou bem patente que não existe nenhuma unidade europeia. A Europa não foi, não é e nunca será uma nação, nem tão pouco terá sequer o sustento mínimo para dar corpo a uma federação homogénea de estados independentes. Porque as diferenças são mais do que muitas (em vários registos e a vários níveis) e porque os fortes não aceitam a igualdade dos mais fracos, nem tão poucos estes últimos aceitam a supremacia dos primeiros.
 
Depois porque, conforme anunciou hoje o primeiro-ministro grego, aconteça o que acontecer a Grécia e a Rússia vão encontrar-se numa cimeira bilateral formal na próxima Sexta-feira, demonstrando ao mundo e aos restantes parceiros europeus, que existem caminhos e soluções alternativas que poderão ser mais facilmente aceites pelos próprios Gregos.
 
Por fim, porque se não for a Rússia será a China ou qualquer potência emergente, disponível para apoiar e, dessa maneira, condicionar, os equilíbrios estruturais sempre periclitantes no velho continente.
 
Em suma, a utopia fantástica de uma Europa una e coesa em clima de fraterna solidariedade e em sã convivência, unida numa estrutura federal em que todos os estados detêm direitos iguais, caiu definitivamente por terra. Tal como tinha acontecido em 1918 e em 1945, existem fortes e fracos, dependentes e independentes, generais e soldados-rasos nesta Europa sem rumo.
 
Hoje, numa Europa dividida pela realidade que se impôs, com um parlamento Europeu onde cerca de 11% dos deputados são contrários à existência da união e advogam a sua dissolução imediata, a tragédia grega é muito mais do que a decisão do que vai acontecer com o País onde a democracia nasceu.
 
Hoje, a Europa trágica da demagogia partidarizante de índole partidocrático e de sustento federalista morreu. E isso, sendo uma tragédia, está longe de ser o acontecimento trágico, final e determinante que nos querem vender os europeístas convictos que nos conduziram para este pântano.