Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

cascalenses

cascalenses

A Igreja Matriz de Grândola

João Aníbal Henriques, 16.09.22
 

 

por João Aníbal Henriques

Integrada na paisagem urbana de Grândola, a Igreja Matriz, com invocação recente a Nossa Senhora da Assunção, é um excelente exemplo da forma como evoluiu a própria localidade. A simplicidade da sua traça, numa apologia assumida ao estilo chão que dá forma à extraordinária expressão arquitectónica do Alentejo, aponta para um sentido neoclássico, porventura resultante das vicissitudes imensas que conheceu ao longo da sua longa História.

Não se conhecendo a sua origem, uma vez que documentalmente a primeira menção a esta igreja data de 1482, quando se efectuou uma campanha de obras que visava contrariar a degradação em que o templo se encontrava, sabe-se que nessa altura o seu orago era Nossa Senhora da Abendada, facto que se alterou já no Século XVI quando lhe foi atribuída a actual designação.

A volumetria que actualmente apresenta, fruto de sucessivas campanhas de obras ali efectuadas pela Ordem de Santiago da Espada, foi determinada pelo visitador-mor da ordem, D. Jorge de Lencastre, Duque de Coimbra, após visita ao espaço em 1513. Nessa altura, em virtude da pobreza original do edifício, a Ordem de Santiago considerou que era pouco digno o carácter campesino da igreja original, com a sua Pia Baptismal feita a partir de uma tina de barro e o chão de terra batida, foi decidida a ampliação do espaço original e a criação de um conjunto de serviços que incluíam basicamente todas as necessidades referentes ao apoio à população.

 

 

A afirmação de Grândola ao longo de todo o Século XVI, quando a pujança fértil das suas terras acabou por ser determinante na criação de excessos de produção que consolidaram a componente mercantil da localidade, traduz-se em sucessivas intervenções na Igreja de Nossa Senhora da Assunção, assim se explicando a riqueza das suas talhas e dos painéis de azulejos que contrastam de forma evidente com a simplicidade do seu traçado.

Nossa Senhora da Assunção, a invocação maior deste período mais recente, aponta simultaneamente para a evolução cultual naquela zona do Alentejo, numa apologia permanente aos mistérios maiores da criação, assertivamente dependentes de um pragmatismo simples expropriado das abordagens mais elaboradas que populações oriundas de outros lugares para ali procuravam trazer. Por isso, para a Senhora da Assunção convergem os interesses, relegando para segundo plano outros tipos de motivações que contradissessem as mais puras formas de expressão da piedade popular. E a nova invocação, sendo ela própria uma assumida ponte entre o carácter mundano da vida comum e o prolixo contexto da religiosidade mais elaborada e exigente das camadas populacionais mais privilegiadas, transforma-se assim no cadinho onde se fermenta uma nova forma de ser e de estar que é determinante para a consolidação do tecido social da própria Vila de Grândola até à actualidade.

Eixo consistente para a estruturação urbana local, a Igreja de Nossa Senhora da Assunção de Grândola é assim o ponto mais significante da localidade, nele reservando toda a informação relevante para compreendermos o que foi a História daquele local.

As Casas da Câmara de Grândola

João Aníbal Henriques, 15.09.22

 

por João Aníbal Henriques

No Século XVI a região de Grândola conheceu um período de crescimento sem par. Os bons anos agrícolas, transfigurados em colheitas de grande potencial, significaram fartura nos índices de produção locais. E o excesso, suprindo de forma cabal as necessidades alimentícias da população, foram escoadas para o mercado, rentabilizando assim a energia despendida no trabalho e reforçando o valor estratégico de toda a região.

Em 1544, a povoação recebeu a sua Carta de Foral, criando assim as bases da sua autonomia administrativa e, por consequência, todas as obrigações e responsabilidades que normalmente correspondiam aos municípios.

 

 

Este esforço, necessário para enfrentar os vários desafios políticos e económicos que acompanharam o crescimento e consolidação da estrutura municipal, exigiam infraestruturas de que a terra não estava dotada. E, para fazer face a essas necessidades, recebeu o município as devidas autorizações para iniciar a construção de raiz de um complexo que fosse capaz de albergar as instalações da Câmara Municipal, as dependências do tribunal e, no seu piso térreo, prisões masculinas e femininas, acompanhadas por habitação para albergar o carcereiro.

Assim, depois de muitos esforços para conseguir recolher os valores necessários para esse avultado investimento, iniciaram-se em 1725 as obras de construção das novas Casas da Câmara que, sem a monumentalidade de outros edifícios congéneres situados noutros concelhos, são bem demonstrativos da periclitante situação em que sempre viveu este município alentejano. A pouca qualidade dos materiais utilizados, e o carácter precário da obra de construção, obrigou à realização de várias obras de manutenção e requalificação ao longo do tempo.

 

 

E em 1755, quando o Grande Terramoto abalou de sobremaneira a estrutura construída da localidade, o edifício ficou profundamente danificado, gerando nova necessidade de recolha de dinheiro para fazer face às imensas despesas de recuperação. É nessa altura que a Coroa assume uma quota-parte das mesmas e, para viabilizar a intervenção urgente que era necessário fazer na construção, oferece ao município a quantia de 664.397 Réis, quantia com a qual se realizou a intervenção e que recuperou o edifício.

Depois de a câmara ter crescido e consolidado a sua importância no contexto municipal alentejano, já em pleno Século XX, o município arrendou outro espaço para instalar os serviços municipais. E as velhas Casas da Câmara, mercê do restauro da Comarca de Grândola, em 1919, foram cedidas para a instalação do tão almejado tribunal.

Pelas suas características urbanas e pelo desenho extraordinário das suas ruas, a Vila de Grândola é hoje um ex-libris da História do Alentejo. E se o final do Século XX lhe consolidou as memórias, sobretudo acentuadas pela ligação perene do município às alterações impostas pela revolução, trouxe também a Grândola um cunho de serenidade que se impôs na paisagem envolvente, transformando-a numa das mais atractivas de Portugal.