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As Obras de Construção do Largo Camões em Cascais

João Aníbal Henriques, 13.05.24
 

 

Até ao dia 10 de Junho de 1980 o actual Largo Luís de Camões, em plano coração da Vila de Cascais, era um sórdido e mal preparado parque de estacionamento a céu aberto. O equipamento, por sua vez, havia substituído com carácter provisório este espaço onde anteriormente existiam casas antigas, prolongando o eixo da Rua Regimento 19 de Infantaria, e que foram demolidas de forma a abrir o espaço e a criar uma praça para onde se pretendia fazer convergir as principais dinâmicas comerciais da velha vila piscatória. As obras em curso, promovidas pelo saudoso Dr. Carlos Rosa, que presidia à Câmara Municipal depois das eleições que foram ganhas pela Aliança Democrática, tinham em vista a definição de uma linha de modernidade que promovesse o comércio tradicional e permitisse a reafirmação de Cascais como destino de excelência no seio da recém-criada Área Metropolitana de Lisboa.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

O Forte das Velas na Praia do Abano em Cascais

João Aníbal Henriques, 17.12.18

 

 
 
por João Aníbal Henriques
 
Só existe um adjectivo com a abrangência suficiente para descrever de forma capaz o popularmente designado Forte do Abano, situado a Norte da Praia do Guincho, em pleno Parque Natural Sintra-Cascais: incrível!
 
Sendo um momento singelo de raiz militar, semelhante tipologicamente a tantos outros existentes ao longo da nossa linha de costa e construído especificamente para garantir a segurança do território Nacional perante eventuais investidas marítimas dos nossos muitos inimigos, é único na sua relação com o espaço e com o enquadramento cénico que lhe dá forma.
 
 

 

 
 
A sua localização, num promontório rochoso entre as Praias do Guincho e do Abano, plena e permanentemente fustigado pela fúria das ondas do mar e pelo vento que chega agreste e forte vindo da Serra de Sintra, confere-lhe um impacto sem par na paisagem. À sua volta, no contraste permanente entre o azul do mar, o branco das nuvens e o verde forte das encostas que dali seguem até à Peninha, a vista alonga-se através de um dos mais inesquecíveis cenários do Concelho de Cascais, potenciando a sua presença e reforçando a sua importância estratégica na definição da vocação turística municipal.
 
Incrível também porque, até contextualizando o monumento na sua mera função figurativa enquanto esteio promocional do turismo desta região, o estado deplorável de abandono, vandalismo latente e degradação acentuada, representa um autêntico atentado ao património de Cascais, dos Cascalenses e mesmo de Portugal.
 
 
 
É totalmente inconcebível que num país como Portugal e num Concelho como o de Cascais, nos quais a projecção da importância do sector turístico é tão grande, seja possível deixar que desleixadamente este tipo de equipamentos se vá perdendo por incúria, desleixo e desinteresse das entidades públicas,  perdendo não só todo o valor cultural que a ele está inerente, como também todo o enorme conjunto de potencialidades económicas, empresariais, culturais, patrimoniais, educativas e outras que o mesmo apresenta. É inconcebível e intolerável que o Estado Português, responsável tutelar pela salvaguarda dos valores que os Portugueses lhe deram à guarda, permita que este tipo de peças patrimoniais chegue a este estado de abandono, não efectuando sequer o mínimo esforço para garantir que os mesmos estão fechados e inacessíveis aos vândalos que os vão degradando.
 
 
 
E infelizmente, este não é caso único, nem singular em Cascais e em Portugal! Intolerável e incrível!
O Forte das Velas, sendo peça integrante no esforço efectuado depois da Restauração da Independência Nacional em 1640, faz parte de um complexo de vários fortes que cruzavam fogo sobre as principais enseadas marítimas de Cascais, recriando uma cortina que visava impedir desembarques indesejados nas principais praias do concelho.
 
 

 

 

 
 
Com a volumetria tradicional da sua época, o também designado Forte do Abano foi construído em 1642 por ordem de D. António Luís de Castro, Conde de Cantanhede e Governador da Praça de Cascais, e inicialmente guarnecido por sete peças de artilharia pesada.
 
Classificado como Imóvel de Interesse Público através do Decreto 129/77, de Setembro de 1977, foi alvo de várias obras de requalificação e adaptação ao longo dos anos, que lhe conferiram o aspecto que hoje apresenta.
 
Na componente de alojamento, teria inicialmente três corpos cobertos virados a Este, protegidos da força do mar pelo terraço onde se instalava o grosso da artilharia, e terá sido reformado em meados do Século XIX, quando o desenvolvimento de novas técnicas militares possibilitou a libertação de algum do espaço de aquartelamento, perdendo o corpo central que foi substituído por um pequeno terraço a céu aberto e pela nova cisterna de captação de água corrente.
 
 
 
 
Da estrutura inicial são ainda de salientar as duas chaminés de aquecimento dos corpos de alojamento situados junto à entrada, vandalizadas possivelmente de forma irrecuperável em época recente, bem como a estrutura de transporte e captação das águas para o seu espaço de armazenamento.
 
Com o enquadramento cénico único propiciado pelo espaço onde se encontra, o Forte das Velas é uma das peças patrimoniais que mais interesse desperta junto dos muitos milhares de veraneantes e passeantes que frequentam a Praia do Guincho, que quase sempre sobem o espaço da encosta para o observar mais de perto.
 
 
 
 
Sobre a porta da entrada, praticamente ilegível debaixo do Escudo de Armas Português, a placa comemorativa da sua inauguração desperta o gracejo dos que o visitam. Em acentuada degradação e em estado de ruína eminente, é simultaneamente um tesouro precioso e um perigo imenso, com a acessibilidade privilegiada que tem cruzada com a falta de controle de quem por ali transita.
 
Resta pouco tempo de vida ao Forte das Velas. Até porque para além do vandalismo a que está sujeito quotidianamente, os próprios elementos se encarregam de o ir destruindo.
 
Com o seu desaparecimento e paulatina degradação perde Cascais, perdem os Cascalenses e todos os Portugueses. Incrível que seja assim!
 
 

Bons Exemplos em Cascais

João Aníbal Henriques, 17.12.17

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Nos dias que correm, adquirir uma casa antiga e optar por reconstrui-la mantendo a traça, a volumetria e a identidade arquitectónica do lugar exige coragem, determinação e arrojo fora do usual. 

 

Mas foi o que aconteceu em Cascais, na Rua Fernandes Thomaz, onde a empresa Cima Sobral - Gestão Imobiliária Lda. efectuou uma obra de requalificação urbana de grande qualidade. 

 

No gaveto entre a Rua das Flores e a Rua Fernandes Thomaz, num quarteirão com a marca do que foi a segunda fase da urbanização de veraneio da vila, no início do Sèculo XX, recuperaram uma das habitações mais marcantes desse período, mantendo inclusivamente o pequeno torreão com terraço que durante muitas décadas identificou a dita habiração. 

 

E porque os bons exemplos devem ser conhecidos e reconhecidos, pois só assim se podem transformar na bitola de qualidade que defendemos para a Nossa Terra, aqui ficam os nossos parabéns à Sara Cima Sobral pela coragem e bom gosto que teve neste processo.

 

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Estertor de Memórias em Cascais

João Aníbal Henriques, 16.02.17

 

 
 
por João Aníbal Henriques
 
Na década de 90, quando cobriram Cascais com uma imensa toalha de betão, era usual dizer-se que “podia ser pior”… E a coberto disso, porque de facto pode ser sempre muito pior, utilizando a mediocridade como bitola e renegando a excelência que foi sempre a principal imagem da Nossa Terra, foram matando a Identidade e a Memória de Cascais. O Projecto de Requalificação da Entrada Nascente de Cascais, que foi ontem apresentado publicamente, representa um retrocesso a esses tempos de má memória. Podia ser pior? Claro que sim. Mas o que se pretende fazer na entrada principal da vila é o assumir definitivo da vocação suburbana de Cascais, abandonando para sempre os parâmetros de excelência de outros tempos e de outras gentes. E já não será possível voltar atrás…
 
O projecto de requalificação da entrada de Cascais é antigo. Praticamente desde a inauguração do hipermercado, em 1973, que os Cascalenses defendem uma intervenção no espaço visando a recuperação dos valores urbanísticos tradicionais e a recriação de uma dinâmica arquitectónica que promova as memórias antigas que subsistem no local.
 
Ao contrário do que refere o esforço de propaganda associado à apresentação pública que ontem decorreu, este projecto é mais um que vem juntar-se aos vários que já foram desenvolvidos e que, para sorte dos Cascalenses, acabaram por nunca se concretizar. Desta maneira, perdidas no meio das ruínas que enchem todo o local, sobrevivem ainda os últimos resquícios de uma memória que Cascais não pode dar-se ao luxo de apagar.
 
 
 
 
O projecto agora apresentado, e que ficará em discussão pública sujeito às sugestões e críticas dos Cascalenses, pretende desenvolver um conjunto de operações urbanísticas que visam o reparcelamento da propriedade e a relocalização do hipermercado. Para os seus autores, a requalificação da principal entrada de Cascais passará pelo enterramento do estabelecimento comercial e pela reformatação de todo o terreno envolvente através da construção de um novo empreendimento que substituirá as ruínas patrimoniais que sobrevivem no local.
 
Mas, se é óbvia a necessidade de intervir neste espaço, até porque a vocação turística municipal é incompatível com o estado de ruína generalizada em que todo o quarteirão se transformou, as opções agora assumidas são profundamente atentatórias do registo de qualidade que os Cascalenses defendem.
 
 
 
 
Em primeiro lugar porque assumem como área de intervenção somente o quarteirão situado entre a Avenida de Sintra, a Avenida Marginal, a Avenida Marechal Carmona e a Rua Henrique Seixas, deixando de fora toda a margem esquerda da avenida, o espaço antigamente ocupado pela Quinta das Loureiras, onde está hoje o CascaisVilla, e os terrenos vazios circundantes. Esta opção, não só impede a recriação de um plano geral que efectivamente requalifique a entrada de Cascais, como constrange, em termos dos parâmetros urbanísticos que hão-de servir de referência nas intervenções a realizar no futuro nos espaços agora deixados de fora, a práxis urbanística que para aqui se defende.
 
Depois, porque para tornar possível a reformatação urbana que pretendem, os autores deste plano defendem a demolição dos últimos exemplares da arquitectura de veraneio que ainda ali sobrevivem, substituindo-os por incaracterísticos edifícios habitacionais suburbanos que não representam a memória do local nem supõem a sua recuperação em prol da identidade de Cascais. Dirão certamente que os edifícios não estão classificados oficialmente, que estão em avançado estado de ruína, etc. E é verdade. Porque embora façam parte do “Levantamento do Património Cascalense”, adquirido pela Autarquia no ano 2000, o actual executivo municipal optou por incluir como anexo ao PDM somente os edifícios classificados, impedindo novos processos de classificação e a consequente recuperação da memória municipal que a eles estaria associada.
 
E, mais importante ainda, despreza por completo o valor identitário dos imóveis situados fora do quarteirão agora intervencionado (infelizmente a Casa da Quinta das Loureiras, onde funcionou o St. George’s School, foi demolida em má hora para construção do CascaisVilla), criando as condições políticas para que todos eles venham a ser substituídos por novos empreendimentos de características semelhantes àquelas que agora se defendem para este local.
 
 
 
 
E seria tão fácil desenvolver neste espaço um projecto verdadeiramente qualificador, minorando o impacto do que de pior lá existe e integrando e promovendo as peças que representam a nossa memória e a nossa identidade...

Em suma, a intervenção que se pretende fazer na entrada de Cascais não requalifica o espaço. Moderniza-o, introduzindo elementos que facilitam a fruição visual para quem chega à vila através da Avenida Marginal, mas despreza a oportunidade de intervir para recuperar uma das mais importantes memórias da Nossa Terra. E ao ser assim, e assumindo a explicação já antiga de que “podia ser pior”, condena a entrada de Cascais a uma mediocridade própria de uma qualquer terreola suburbana, arrastando definitivamente consigo a grandiosidade extraordinária que sempre definiu o charme empolgante e a vocação de excelência de Cascais.
 
E é uma pena que seja assim. Porque a Cascais já não restam muitas oportunidades. 

A Areia e a Capela de São Brás em Cascais

João Aníbal Henriques, 09.12.16

 

 
 
por João Aníbal Henriques
 
Quando em 1997, em pleno processo de preparação do Levantamento Exaustivo do Património Cascalense, publiquei um trabalho sobre a história da ruralidade da Freguesia de Cascais (*), a povoação da Areia era ainda palco privilegiado das ancestrais tradições rurais que deram forma ao município de Cascais.
 
No Largo de São Brás, expressão máxima do sentido comunitário da localidade, congregavam-se os elementos principais de uma existência na qual a ligação aos trabalhos da terra e uma dependência extrema relativamente às agruras da natureza, se revezavam amiúde, representando o principal sustentáculo de um ideário comunitário comum que conduziu à arreigada identidade que a localidade ainda possui.
 
 
 
A Capela de São Brás, o chafariz e o lavadouro comunitário, partilham por ali o coração simbólico da Areia, dando forma a uma existência na qual a singeleza do quotidiano funciona como elemento motivador de uma forma de ser e de estar que fomenta o tecido social do local.
 
 
 
 
A Areia, de cujas origens pouco se conhece, apresenta um topónimo que deriva da proximidade à Praia do Guincho e a estrutura pobre dos seus solos. Mas, é também essa aparente fragilidade natural que, conjugando-se em processos dinâmicos de sobrevivência, vem determinar uma série de práticas que são vincadamente locais e extraordinariamente únicas no contexto da existência rural de Cascais e de Portugal.
 
Do período romano, o povoado dos Casais Velhos, com a milenar fábrica de púrpura e a ligação directa à cabeça do Império, representa a expressão máxima da sua monumentalidade, traduzida em algo que, apesar do abandono a que tem sido devotado ao longo dos últimos anos, é irrepetível e assume laivos de primeira linha no inventário do património Cascalense.
 
Mas a Capela de São Brás, situada em plano coração da Areia, é também ela eixo essencial na estruturação moderna da localidade, representando um papel catalisador no desenvolvimento da estrutura social que há-de definir o devir quotidiano naquele espaço.
 
Sem origem cronológica conhecida, a Capela de São Brás que hoje conhecemos será certamente o resultado de um processo de paulatino desenvolvimento. A sacralidade do local, provavelmente marcado por um antigo templo e/ou ermida que por lá tenha existido, foi necessariamente o ponto de partida de uma expressão cultual que gera em seu torno os elementos necessários à fixação humana. Em 1527, quando se realizou o primeiro recenseamento à população, a Areia tinha somente nove vizinhos, o que corresponde a pouco mais de duas dezenas de pessoas, que entre si partilhavam os parcos recursos que resultavam do trabalho da terra.
 
 
 
 
A pobreza material da população, cessada que estava a exploração riquíssima da produtiva fábrica de púrpura, está bem expressa na formulação urbanística da localidade e, sobretudo, no carácter chão da arquitectura desta sua capela. De traços simples e simbolicamente próxima dos valores muito regulares que sempre caracterizaram a existência local, a Capela de São Brás conjuga em si os principais elementos que nos ajudam a perceber e a conhecer a povoação.
 
A devoção a São Brás, o santo arménio que começa a sua vida adulta como médico e que abandona tudo o que tem e o seu dia-a-dia na cidade depois de ouvir o chamamento de Deus, é também ela ilustrativa do carácter longínquo que a Areia representou durante muitos anos, em linha com a opção do Santo por uma vida de eremita, devotado à interioridade e à oração, em comunhão profunda com a solidão da natureza. A singeleza da história, a mesma que caracteriza a Capela de São Brás e mesmo o devir quotidiano na localidade da Areia, dão nota desse desligar sentido das correntes que nos prendem permanentemente à clausura da materialidade, representando um ímpeto de libertação que é resultado da proximidade a Deus.
 
A Areia, na sua ligação a São Brás, representa assim a profundidade da entrega devocional de Cascais à causa do despojamento material, numa sentida e assumida opção pela simplicidade extrema.
 
As duas devoções que estão nos altares secundários deste templo, entregues a Nossa Senhora de Fátima e ao Sagrado Coração de Jesus, são também elas expressivas deste caminho, denotando uma continuidade na prática devocional que terá obrigatoriamente de assentar numa vivência comunitária solidamente assente num conjunto e valores simbólicos desenvolvidos ao longo de muitos anos.
 
Visitar a Areia e a Capela de São Brás, num exercício de libertação perante a opressão sensível do charme de Cascais e dos Estoris, é assim uma oportunidade para entender a perenidade desta escapatória axial na formulação mais profunda da comunidade e do património Cascalenses.
 
 

 

(*) HENRIQUES, João Aníbal, História Rural Cascalense, Cascais, Junta de Freguesia de Cascais, 1997.

A Capela de Nossa Senhora da Graça em Tires

João Aníbal Henriques, 14.11.16

 

 
 
por João Aníbal Henriques
 
Dizem os eruditos que a pequena capela de Tires foi dedicada a Nossa Senhora da Graça num acto de gratidão pelos benefícios recebidos pelos pescadores de Cascais, em 1362, quando foram libertados do jugo administrativo de Sintra.
 
O templo, no entanto, é muito mais recente, e embora não esteja datado em termos documentais, tal como acontece com a generalidade de espaços de culto semelhantes, será provavelmente originária do Século XVI ou XVII.
 
De planta simples e uma só nave, integra-se esta capela na tipologia mais comum dos monumentos de cariz rural e de estilo chão, espraiando a devoção dos habitantes mais humildes e geralmente ligados de forma perene à terra e à sua produção.
 
A inovação da Senhora da Graça, “Ó Maria concebida sem pecado, rogai por nós que recorremos a vós”, remete-nos para um universo religioso profundamente marcado pelas devoções antigas que proliferaram no actual território de Cascais desde tempos ancestrais. A concepção imaculada da Virgem-Mãe, arquétipo primordial da religiosidade pré-Cristã em Cascais, denota precisamente essa ligação à terra e aos ciclos da fertilidade, conduzindo-nos, numa linha mística repleta de significado, para a própria essência profunda e sagrada de Portugal.
 
 
 
 
De facto, Nossa Senhora da Conceição, Rainha e Padroeira de Portugal, foi sempre elemento indissociável das graças concedidas a este País, num fluxo constante de oração e Fé que marcou de forma indelével os mais importantes momentos da nossa História. O apelo à Rainha, mãe ancestral de todos aqueles que utilizam a força da natureza como bitola definidora das suas escolhas materiais, num «Ó» de súplica que fomenta os mantras sonoros típicos da sabedoria mais avançada, faz-se precisamente através de um acto de entrega total e absoluta à vontade de Deus numa ligação profunda ao martírio de Cristo em defesa dos seus pares.
 
Em Tires, Nossa Senhora da Graça é assim espaço de memória que se define a partir do fulcro mais importante da existência cultural da localidade. Com a sua estética simples, num corpo em que a única nave abre caminho simbólico em direcção ao céu, são de sublinhar os elementos decorativos esculpidos na pedra calcária da porta principal, nos quais a flor, natureza em movimento, nos transporta para a concepção onírica dos planos mais elevados. A torre sineira, simples na sua formulação, mas perfeita na forma como se integra na estética do lugar, prima pela proporcionalidade que fomenta o carácter da capela.
 
 
 
 

 

A Capela de Tires, no centro nevrálgico da localidade, é assim uma espécie de eixo definidor que nos permite conhecer melhor Portugal e a história recente das gentes anónimas de Cascais. Deve ser conhecido e reconhecidamente integrado na vocação turística deste lugar. 

A Capela de São Sebastião em Cascais

João Aníbal Henriques, 26.09.16

 

 
 
 
por João Aníbal Henriques
 
Passaram-se muitos meses desde que o temporal do Outono de 2015 destruiu o cruzeiro, o alpendre e o adro da Capela de São Sebastião, em Cascais. Mas, finalmente, foram efectuadas as obras de recuperação e reposta a dignidade daquela importante peça do património cascalense.
 
A Capela de São Sebastião, construída provavelmente em 1628, atendendo à inscrição existente na base do seu cruzeiro, possui um interessante conjunto azulejar cujas origens dispersas não se conhecem com exactidão.
 
A sua localização, fora da localidade e já muito perto da Enseada de Santa Marta, terá sido determinante para a sua formulação arquitectónica simples, em estilo dito “chão” e para as suas origens eminentemente ruralizantes. Situada originalmente na cerca do antigo Convento de Nossa Senhora da Piedade (actual Centro Cultural de Cascais), seria certamente posto avançado de oração e recolhimento daquele importante núcleo religioso da Vila de Cascais.
 
 
 
 
De acordo com alguns autores, serão do antigo convento, que foi construído em 1594 por D. António de Castro, então Senhor de Cascais e pela sua mulher D. Inês Pimentel, alguns dos painéis de azulejos que hoje se podem ver na capela e nas zonas envolventes. O mais importante, hoje colocado de forma cenicamente impactante no jardim construído no local pelos Condes de Castro Guimarães, é precisamente a “Procissão Alquímica” em que Nossa Senhora é transportada aos céus numa imensa carruagem inserida num cortejo do qual fazem parte algumas das mais importantes figuras da imagética transcendental da Portugalidade Sebástica.
 
O certo é que quer na figura “Civitates Urbius Terrarum” da autoria de Georgius Branius, de 1572, quer na planta geral da Vila de Cascais, datada de 1594 e guardada no Arquivo Geral de Simancas, a pequena capela surge expressamente representada, sendo certo, por esse motivo, que já nessa altura fazia parte do património religioso da localidade.
 
 
 
 
Na parede do adro, com datação provável dos finais do Século XVII, e correspondendo a uma das campanhas de obras de remodelação que o edifício terá sofrido ao longo da sua história, existe um painel azulejar polícromo dedicado ao Santíssimo Sacramento e, como não poderia deixar de ser numa peça de património de índole rural, à Imaculada Conceição da Virgem Maria. Uma vez mais, como é evidente, cerca de dois séculos antes de o Papa Pio IX, através da bula Inneffabilis Deus, ter solenemente definido a Imaculada Conceição como dogma, em linha com o que acontece com as principais orientações cultuais no Portugal de então e, especialmente, com as ancestrais tradições religiosas existentes no Concelho de Cascais.
 
O orago Sebastianista da capela, apelando ao supremo poder de Deus perante os homens e à permanente necessidade destes de tentarem impor a sua vontade, recupera também ele os laivos dessa paulatina degeneração dos cultos mais antigos das populações locais que, depois de Cristianizados, acabam por integrar-se de forma definitiva no conjunto de pressupostos sagrados que dão forma à Fé local.
 
 
 
A recuperação da Capela de São Sebastião, para além de um importante contributo para a consolidação da vocação turística municipal, que depende da existência de uma oferta significante que concretize a Região do Estoril como um destino turístico de excepção no contexto europeu, significa ainda o assumir da Identidade Cascalense, assente num imaginário colectivo na qual as memórias físicas se cruzam quase sempre com os vestígios materiais de gerações ancestrais.
 
É, por isso, uma boa notícia para a Nossa Terra!
 

Património de Cascais - Memórias Antigas da Nossa Terra

João Aníbal Henriques, 20.09.16

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Na semana em que Cascais se prepara para comemorar o património, oferecendo à sua população a possibilidade rara de visitar peças que fazem parte da identidade Cascalense e que estão normalmente fechadas ao público, importa recuperar este que é um dos temas mais importantes para a Nossa Terra.

 

Entre 1993 e 2000, a Fundação Cascais preparou o “Levantamento Exaustivo do Património Cascalense”  O trabalho agregou um conjunto de seis bases de dados (uma por cada freguesia) com um total de 2900 fichas patrimoniais e cerca de 500 páginas de sugestões e propostas que tinham como principal objectivo recriar um instrumento de trabalho profícuo para a administração municipal.

 

O L.E.P.C. foi publicado em versão electrónica através de um suporte em CD-Rom, tecnologia de ponta naquela época, facto que se tornou possível depois do apoio que a instituição recebeu da Câmara Municipal de Cascais para esse efeito, tendo sido distribuído gratuitamente em todas as bibliotecas e escolas do município.

 

Infelizmente, 16 anos depois dessa publicação, uma parte substancial das peças patrimoniais inventariadas pela Fundação Cascais já desapareceu. Algumas foram destruídas pela fúria do betão e deram lugar a espaços incaracterísticos que todos conhecemos; outras desapareceram como consequência da ruína que resultou do seu abandono; e outras tantas, embora devidamente classificadas, foram “esquecidas” pelo poder político, vendo desaparecer todo o potencial turístico, cultural e social que ainda possuíam.

 

Em 2003, quando a Fundação Cascais publicou a sua revista dedicada ao património, fez-se o ponto-de-situação em que nos encontrávamos… Isabel Magalhães, então presidente do Conselho de Fundadores, dizia que “a inventariação e a posterior classificação dos imóveis com valor, é o primeiro passo que se deve seguir para combater a degradação”. Filipe Soares Franco, o então presidente do Conselho de Administração, sublinhava que “apesar de ter sido notório o apoio da sociedade civil a esta causa, os partidos políticos ignoraram o apelo, criando assim as condições que permitiram a delapidação patrimonial de Cascais”. Pedro Luís Cardoso, tesoureiro da instituição, dizia que “sem património e sem memória fica comprometida a vocação turística de qualidade de Cascais” e João Aníbal Henriques, coordenador do projecto, explicava que “no ano 2000, quando a Fundação Cascais entregou à Autarquia o ‘Levantamento Exaustivo do Património Cascalense’, com seis bases de dados e cerca de 2900 imóveis inventariados, deixou de existir desculpa para o desconhecimento que se alegava noutros tempos”.

 

Tantos anos depois, quando muitos dos imóveis que constam no Levantamento Patrimonial realizado pela Fundação Cascais já são história e não passam de memórias difusas de alguns Cascalenses, vale a pena voltar a percorrer cada uma destas fichas e destas fotografias que ainda se encontram por aí em bibliotecas espalhadas por esse País fora.  Por ali se encontram os laivos oníricos de um Cascais que soçobrou perante os muitos interesses que permanentemente se digladiam à sua volta, mas também os pilares indestrutíveis de um edifício de cidadania que dignifica a Nossa Terra.

 

 

Clique AQUI para reler a Revista Fundação Cascais dedicada ao Património Cascalense

 

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O Triste Caso da Capela de São Sebastião em Cascais

João Aníbal Henriques, 16.03.16

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No Outono passado a Capela de São Sebastião, situada no Parque do Gandarinha junto à entrada do Museu dos Condes de Castro Guimarães, foi bastante danificada por um temporal. O seu alpendre, o adro e o cruzeiro fronteiro à mesma, foram destruídos pela intempérie e a edilidade fechou o espaço para prevenir eventuais danos para os visitantes.

 

Passaram-se até agora muitas semanas desde aquele triste acontecimento e a dita capela, monumento importante da memória patrimonial de Cascais, continua no mesmo estado de ruína. Pela sua frente passam diariamente centenas de passeantes e turistas, não só aqueles que vão visitar o museu, como também todos os que atravessam o parque a partir da entrada da marina.

 

Com um clima de feira permanente instalado em Cascais, em que se montam-desmontam-e-voltam-a-montar barracas que enchem os mis emblemáticos recantos da vila, a Câmara Municipal de Cascais ainda não teve tempo nem vontade para arranjar os estragos na capela.

 

É indecente.