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Portugal Encavacado

João Aníbal Henriques, 23.10.15

 

 
 
Apesar as controvérsias, das discórdias, das polémicas mediáticas, das diferenças de opinião e de todo o conjunto de interesses que dão corpo a este sistema eleitoral partidarizado e pouco democrático que temos (é preciso lembrar que os Portugueses nem sequer são livres de escolher o(s) deputado(s) que os vai representar na Assembleia da República e que, à laia de embuste, são obrigados a fazer uma selecção daqueles que são escolhidos pelos partidos), existe uma conclusão óbvia, linear e inquestionável das eleições legislativas que decorreram no passado dia 4 de Outubro: o vencedor foi a coligação entre o PSD e o CDS.
 
Tiveram mais votos e ganharam as eleições. E, por isso, deveriam ter sido indicados pelo Presidente da República para formarem governo. Depois, com é evidente, os 230 deputados que compõem a assembleia logo decidiriam o que fazer, e arcariam com a responsabilidade da(s) sua(s) decisões perante Portugal e os portugueses.
 
Mas Cavaco Silva, uma vez mais estragou tudo. Quando devia simplesmente ter procedido à indigitação do vencedor das eleições para formar governo, calando-se de seguida de maneira a garantir o normal funcionamento das instituições, proferiu um discurso absurdo e completamente descontextualizado, com laivos de uma raiva que põe em causa a isenção e o distanciamento que o presidente deve ter em relação às escolhas dos portugueses.
 
Ao fazê-lo, Cavaco Silva condicionou de maneira inconcebível o universo partidário e gerou um sentimento de desconforto que põe em causa os interesses de Portugal. 
 
Agora, que o mal está feito, há uma coisa que importa sublinhar para que ninguém no futuro se venha a esquecer: Cavaco Silva é o responsável por tudo aquilo que vier a acontecer aos Portugueses. E deve ficar na história com esse ónus. Porque a decisão foi dele.

O que é uma arruada? por Vasco Pulido Valente

João Aníbal Henriques, 02.10.15

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A dois dois de eleições legislativas, as televisões Portuguesas foram inundadas com um fenómeno de propaganda que é transversal a todos os partidos e que parece estar na moda: a ARRUADA! Mas, segundo Vasco Pulido Valente, não é fácil definir o que é isso da ARRUADA: "À primeira vista, elas parecem tentativas para atrair à força a atenção do povo. O chefe do partido chega, com a sua corte, a sua “segurança” e uma camioneta ou duas de militantes, a uma rua suficientemente frequentada e começa a falar a desconhecidos que estão ali a tratar da sua vida. Aparecem uns maluquinhos que abraçam ardorosamente o chefe do partido, porque gostam de abraçar celebridades e abraçariam Ronaldo com igual ardor. Não se retira nada desta lusitana (?) espécie de exercício: nem uma ideia, nem um voto, nem um tostão. Alguns zelosos patetas pensam que uma “boa arruada” demonstra “força”. Erro deles. Mas quem somos nós para pedir melhor? A farsa da política portuguesa não parava com certeza à porta da campanha".

 

Leia AQUI o texto integral de Vasco Pulido Valente no Jornal Público

O Estranho Caso da Catalunha

João Aníbal Henriques, 28.09.15

 

 
 
por João Aníbal Henriques
 
Há alguns anos atrás (talvez bastassem dez) os resultados das eleições de ontem na Catalunha deixariam perplexos todos aqueles que para eles olhassem com um mínimo de atenção. Em primeiro lugar porque quem ganhou perdeu e quem perdeu ganhou… e, depois, porque ficou evidente a fragilidade nacional espanhola bem como a solidez estrutural da federação que os Reis Católicos recriaram há mais de 500 anos.
 
Se é certo que os independentistas catalães ganharam as eleições por terem conseguido eleger um maior número de deputados, é certo também que perderam as eleições por terem tido menos votos. Numa analogia muito pertinentes com o que pode vira passar-se em Portugal no próximo Domingo, os catalães demonstraram que perceberam bem a incoerência do sistema eleitoral que a Europa continua a utilizar que, nada traduzindo da realidade que temos, se distancia progressivamente dos cidadãos e impede a sua real representatividade e, logo, os fundamentos da própria democracia. Os que votaram, fizeram-no completamente divididos e profundamente desvinculados das causas imensamente fracturantes que estavam em causa. Os outros, ou sejam, os pouco mais de 22% de catalães que não quiseram participar neste acto eleitoral, vieram ainda reforçar mais este fenómeno de afastamento político, considerando-se mais grave ainda por se saber que dele dependia uma das mais importantes e impactantes decisões da História da Espanha.
 
Sendo estranho e muito complexo o cenário que resultou destas eleições, é linearmente o fim da linearidade que tem presidido à definição da realidade política na Europa, ajudando a clarificar e a explicar muitos dos fenómenos fracturantes que ultimamente têm sido apanágio do quotidiano no velho continente. As questões que se prendem com as dúvidas relativamente às dívidas soberanas, os resgates impulsionados pelos organismos internacionais, a tentativa de interferência nas políticas nacionais por parte da Alemanha federal ou mesmo as mais recentes (e intoleráveis) incertezas com a chegada dos refugiados, ganham uma nova perspectiva à luz do grito que ontem proferiram muitos catalães.
 
Em relação a Portugal, fracturado sem se saber muito bem porquê, dado que todos os candidatos às eleições de Domingo (radicalismos eleitoralistas à parte) concordam no essencial acerca daquilo que seria a sua opção política caso vençam o plebiscito, muito se esclarece em relação à incompreensível sobrevivência política da coligação PSD-CDS e ao também incompreensível desnorte de um PS aparentemente incapaz de lidar com a sua história. E se tudo está em aberto em relação às eleições legislativas que aí vêem, o certo é que aconteça o que acontecer o aparentemente estranho caso da Catalunha nos vem mostrar que um mundo novo e uma Europa diferente da que temos está prestes a nascer.
 
Porque já nada é o que era dantes. 

Censura Prévia à Democracia

João Aníbal Henriques, 24.04.15

 

 
 
Nas vésperas de mais um aniversário da revolução de 1974, no meio de uma pretensa guerra feroz entre os partidos que controlam a democracia, eis que PSD, PS e CDS se juntam para alterar as regras que determinam a forma como a comunicação pode cobrir as campanhas eleitorais.
 
Os três partidos, que foram capazes de gerar consensos em torno desta temática, pretendem passar a intervir directamente na liberdade de informação, condicionando os jornais e os jornalistas à apresentação de um plano prévio que será autorizado (ou não) por uma comissão dita independente que será composta por três elementos- dois da Comissão Nacional de Eleições e um da Entidade Reguladora para a Comunicação Social – que conforme facilmente se percebe, são escolhidos por eles… ou seja, com esta proposta, os partidos políticos que controlam o poder passam a controlar também o que pode e como pode a comunicação social informar os Portugueses! Com esta surpreendente proposta, deixa de existir liberdade de informação, voltando a haver uma versão “normalizada”, “controlada” e “adaptada” dessa mesma realidade, evitando assim que Portugal e os Portugueses possam conhecer o que realmente vai acontecendo. O regresso de uma espécie de “visto prévio” sem o lápis azul!
 
Contado desta maneira, quase parece mentira que tenha sido possível chegar-se a este ponto. Conhecendo os partidos em questão, com as dúvidas que o PSD tem apresentado relativamente à confiança que lhe merece o CDS; com a irrevogável incapacidade demonstrada pelo CDS para corresponder com transparência aos desafios que lhe são colocados pelos Portugueses; e com um PS literalmente a navegar na maionese sem ser capaz de apresentar uma alternativa politicamente credível aos Portugueses; todos perceberam que nenhum deles representa quem quer que seja e que, por isso, estão condenados a desaparecer paulatinamente dos laivos e resquícios de democracia que ainda sobrevivem neste País sui-generis. E imediatamente foram capazes de se sentar juntinhos à mesa para cozinhar este acordo que põe em causa a liberdade dos Portugueses… 
 
Parece mentira. Mas infelizmente não é.
 

Cinismo Verde em Portugal

João Aníbal Henriques, 16.01.15

 

 
 
por João Aníbal Henriques

 

O ano de 2015 inicia-se em Portugal com uma tresloucada apetência pelas preocupações ambientais… num acto de desvario que resulta do cruzamento sempre complexo entre as necessidades eleitorais e as que resultam da crónica falta de dinheiro, o estado e as autarquias de diversas sensibilidades políticas e partidárias convergem numa pseudo-defesa intransigente dos interesses ambientais de Portugal, utilizando essa máxima descabida para esconder as reais motivações que estão por detrás da decisões que vão tomando para defender os seus interesses particulares.
 
A primeira destas medidas foi a da chamada “política dos sacos”. Concretizada pela coligação governativa formada pelo PSD e pelo CDS, pretende cobrar-se um imposto que adjectivam como “verde” sobre cada saco de plástico utilizado em Portugal. Dizem eles (e têm razão) que o plástico utilizado nos ditos sacos é imensamente poluente e que, com este imposto, Portugal conseguirá reduzir drasticamente o impacto negativo que tem nesta área.
 
Mas dizem também, sem nenhuma vergonha, que a política dos sacos resulta em primeira instância da necessidade de colmatar o défice orçamental imposto pelo chumbo das propostas orçamentais pelo Tribunal Constitucional. Em suma, se não houvesse este conjunto de constrangimentos orçamentais, o governo pouco se importaria com o impacto dos sacos no ambiente e jamais lhe passaria pela cabeça a criação deste imposto cinicamente “verde”!
 
Em linha com este exercício hipócrita, e novamente ao sabor do eleitoralismo que dará forma a 2015, a câmara socialista de Lisboa veio mostrar-se preocupada com o ambiente no centro da cidade (no resto da cidade não importa nada a poluição…) e impôs restrições à circulação automóvel em algumas zonas da cidade.
 
E tem razão para se mostrar preocupada. A poluição provocada pelo trânsito automóvel é enorme e precisamos urgentemente de criar medidas que libertem as nossas cidades deste flagelo.
 
Mas, no caso específico de Lisboa, a hipocrisia dá forma a mais esta medida hipocritamente “verde”. Ao estabelecer uma idades para definir os carros que podem, ou não, circular na cidade, a edilidade assumiu que os critérios para essa circulação não são o grau de poluição provocado pelos veículos, mas sim uma cínica balança entre os votos dos quais necessitam os partidos que estão no poder, e o politicamente correcto que desde sempre se associa ao ambiente.
 
Senão vejamos: um Opel Corsa B, adquirido novo em 1997, com uma cilindrada de 1200 cm3, emite 156 g/km de CO2 e está proibido de circular em grande parte da cidade de Lisboa. Mas, por exemplo, um BMW 550D, adquirido novo em 2014 e com um índice de emissões na ordem dos 166 g/km de CO2, mais elevado do que a do velhinho Opel Corsa, pode circular livremente! 

O Estado da Anestesia em Portugal

João Aníbal Henriques, 17.11.14

 

 

por João Aníbal Henriques

 

Rebentou na última semana um dos maiores escândalos de sempre em Portugal. Com mais de uma dezena de envolvidos escolhidos de entre alguns dos mais altos funcionários do Estado, este escândalo mostra aos Portugueses um novo nível de corrupção, mais em linha com um qualquer romance de cordel do que com a triste história que actualmente caracteriza este país em que vivemos.
 
Infelizmente, depois do enredo que envolveu o mais escandaloso início de um ano lectivo em Portugal; da incrível estória protagonizada pelo Ministério da Justiça e dos seus inventados sabotadores encomendados que paralisaram os tribunais e a própria justiça durante muitas semanas; do extraordinário caso de falência do Grupo Espírito-Santo, com as incompreensíveis intervenções do Banco de Portugal, do Governo e do Presidente da República; da odorífera facada nas costas dada no líder do PS pelo seu correligionário socialista que ainda é presidente da Câmara Municipal de Lisboa; da cisão absurda e tremenda na já de si liderança bicéfala do Bloco de Esquerda; da maravilhosa estória da decisão irrevogável do Presidente do CDS; do abrasileirado escândalo da destruição da Portugal Telecom, acompanhado pelos prémios chorudos que foram dados aos que cavaram a sepultura daquela empresa estratégica para Portugal; de um Presidente da República que tibuteantemente mostrou não estar interessado em intervir directamente nos destinos do nosso Estado e de um Governo que assobia alegremente perante o descalabro geral que caracteriza Portugal, pouco ou nada resta para dizer, pensar ou discutir neste nosso desgraçado país…
 
A dose de irrealismo, que dantes se comparava ao caos que se instalou durante a primeira república mas que actualmente já o ultrapassou largamente, transformou Portugal numa espécie de grande arena de circo na qual tudo pode acontecer.
 
Já ninguém se espanta, nem ousa sequer criticar ou contrariar as desvairadas decisões de quem detém o poder. Para quê?...
 
E, se a nível estatal as coisas atingiram um descrédito que é transversal a todos os partidos e a todos os sectores de actividade, a nível local a situação não é diferente. Presidentes de câmaras legitimados pelos votos das eleições de 2013, põem e dispõem da coisa pública como se ela fizesse parte do seu pecúlio pessoal. Os balcões das empresas municipais, repletos de faces airosas oriundas das juventudes dos partidos onde trabalharam gratuitamente em troca de um emprego, são uma espécie de pastos onde a maralha divide o pouco que Portugal ainda consegue produzir.
 
E quem pode pensar em criticar esta gente? Ninguém! Pois se é tudo assim… se todos fazem o mesmo… se ninguém assume as consequências dos seus actos e se à boca cheia se regurgita a máxima de que quem não come é parvo!...
 
O certo, para alguém que ainda gosta de Portugal e que acredita que ainda é possível salvar a herança que recebemos dos nossos avós ao longo de mais de oito séculos, é que já pouco ou nada há a fazer. Pelo menos de dentro desta máquina de devastação onde os equilíbrios são precários e as dependências são transversais a toda a gente.
 
Entretanto, enquanto lá fora as estações vão passando, cruzando eleições futuras com os muitos interesses que todos sabem que dão forma ao nosso Estado, continuam um espectáculo deprimente que todos somos obrigados a ver e a financiar.
 
Os Portugueses estão anestesiados, incapazes até de reagir ao que no estão a fazer. E ainda bem que assim é! Porque senão seria insuportável a dor perante o desrespeito atroz perpetrado por esta gente. 
 

Não vale a pena! The show must go on! Já não há nada que se possa fazer… 

Os Caminhos da Constituição

João Aníbal Henriques, 17.07.14



por João Aníbal Henriques

Com a aproximação das negociações que levarão à apresentação de mais um Orçamento de Estado, multiplicam-se já na comunicação social e nas redes sociais as notas sobre um eventual futuro chumbo às mesmas por parte do Tribunal Constitucional.

Como se não vivêssemos num estado de direito, no qual as instituições estatais têm como missão fazer cumprir os valores e as regras constantes na Lei, grassam os ditos irresponsáveis que sacodem as águas mornas de um Verão no qual a guerra eleitoral acontece surpreendente no maior partido da oposição, contaminando com os laivos assanhados dos que lideram essa batalha a percepção e a discussão em torno daquilo que verdadeiramente importa aos Portugueses.

Todos conhecemos bem as origens inglórias da constituição que temos. Todos sabemos bem quão anacrónica e descontextualizada ela se afigura perante os desafios que se levantam a Portugal. Mas, ao invés de assistirmos a um debate político em torno da adaptação da Constituição aos novos tempos em que vivemos, governo e oposição mergulham de forma desenfreada numa luta de guerrilha que tem somente como objectivo salvar a face dos partidos que lhes conferem poder, sem nenhum respeito, honestidade ou verdade perante as muitas necessidades que se vivem cá dentro.

E se é absurda a guerra intestina que acontece no PS numa altura como esta em que Portugal corre o risco de soçobrar definitivamente, mais absurda ainda é a falta de coragem do PSD e do CDS para fazerem a revisão constitucional que é tão premente.

Ao apresentar, ano após ano, propostas que reiteradamente chumbam nas suas bases constitucionais, só podemos concluir que das duas uma: ou o governo não conhece a Constituição que temos, e por isso persiste nesta senda anedótica de ir fuçando e tentando fazer aquilo que é necessário para retirar Portugal da crise em que vivemos; ou conhece e, persistindo no erro, teima hipocritamente fazer passar medidas que já sabe de antemão que serão chumbadas e que servem somente para encapotar o aumento da carga fiscal que, também ano após ano, vai impondo aos Portugueses…

Em qualquer dos casos, sabendo que é necessário rever a Constituição mas não o fazendo, PSD, PS e CDS estão hipocritamente a jogar o jogo do poder, compactuando nesta senda vergonhosa que condena Portugal a um fim inglório e que nenhum de nós alguma vez pensou ver.

Será que esperam que daqui a algum tempo, a dita revisão se faça à força, sem democracia, sem representatividade e contra a vontade dos Portugueses?...

Portugal: Uma Pátria sem Povo

João Aníbal Henriques, 11.06.14

 

por João Aníbal Henriques

Num 10 de Junho marcado pelo desmaio do Presidente da República, Cavaco Silva, em se pretendia comemorar o Dia de Portugal e dos Portugueses, assistimos tristemente ao estado de vazio exemplar a que deixaram chegar Portugal.

A cerimónia comemorativa, preparada ao pormenor, foi pensada para a praça principal da cidade da Guarda na qual, em frente à extraordinária fachada da Sé, se conjugavam todas as condições cenográficas para tão importante ocasião.

Mas, estranhamente, destas cerimónias ficou arredado o público – leiam-se os Portugueses – que foram impedidos de aceder àquele espaço. Esta decisão, que nenhuma entidade oficial se dignou explicar, ficou naturalmente a dever-se ao medo da contestação popular. Afinal, no Dia de Portugal e dos Portugueses não é suposto ouvir-se a voz dos próprios…

E, com o desmaio de Cavaco a encher televisões e capas de jornais, fica reduzido ao sorriso cínico do sindicalista perverso perante a adversidade do Chefe de Estado, o estado a que conduziram Portugal.

Sem povo e sem Portugueses, este dia foi somente mais uma oportunidade para o confronto desonroso dos partidos e dos poderes que controlam Portugal, digladiando-se numa luta que coloca os seus interesses à frente dos interesses do País e gerando uma onda de insignificância que se traduz na abstenção eleitoral que todos bem conhecemos e num ódio crescente que ontem todos verificámos.

Dirão que é este o Portugal que temos. Não é verdade.

Este Portugal que encheu a comunicação social, do qual ficaram arredados os Portugueses, é um Portugal artificial, desinteressante, promíscuo, insignificante e reles. É o Portugal do rotativismo eleitoral em que vivemos e que eles teimam em continuar a chamar democracia. Um regime que não respeita os Portugueses, os seus sentimentos e as suas necessidades. Um regime fechado sobre si próprio e a sugar dia após dia, os últimos laivos de uma grandiosidade que a Pátria ainda tem mas que eles estão quase a conseguir matar.

O que ficou deste 10 de Junho?

Nada. Infelizmente para Portugal. 










António Capucho e a Democracia do PSD

João Aníbal Henriques, 12.02.14



por João Aníbal Henriques

Sabendo-se de antemão que iria acontecer, até porque antes de iniciado o julgamento, os juízes já haviam anunciado a sentença que dele viria a resultar, não deixa de chocar a expulsão do Social-Democrata António Capucho do PSD.

A primeira grande questão que se coloca tem a ver com o próprio perfil de António Capucho. Fundador do PSD, onde esteve desde a primeira hora com Sá Carneiro, o ex-autarca de Cascais desempenhou ao longo das últimas quatro décadas cargos de grande destaque na vida política Nacional, dando corpo e cara pelo seu partido e, principalmente, pela ideologia Social-Democrata na qual acredita e que sempre defendeu. Foi Secretário-Geral do partido, deputado, secretário de estado, ministro e líder do grupo parlamentar, antes de ter decidido dedicar-se à sua terra, ganhando a presidência da Câmara Municipal de Cascais por três vezes e de ter sido um destacado membro do Conselho de Estado.

Ou seja, Capucho representou, defendeu e lutou pelo seu partido e pela Social-Democracia uma vida inteira e parece que o PSD sempre valorizou o que ele fez. Agora, sem apelo nem agravo, de forma cega e pela mão de “escravos dos estatutos” resolveu que já não lhes interessava tê-lo com eles. E das duas uma: ou mudou António Capucho – o que efectivamente é notório que não aconteceu – ou mudou o PSD…

Enquanto edil de Cascais, concorde-se ou não com todas as decisões tomadas por ele, António Capucho assumiu uma postura de grande rectidão no cumprimento daquilo que propôs aos munícipes que o elegeram, por três vezes e sempre com maioria absoluta… Foi capaz de se manter irredutível no travão à especulação imobiliária que grassava em Cascais, lutando contra poderes enormes e muito consolidados no Concelho e, depois, com um grau de respeito pelos outros e por quem pensa de forma diferente (coisa a que Cascais já não estava habituado), tratou sempre com consideração os cascalenses que a ele se dirigiram, ouvindo as suas ideias e propostas, aceitando algumas e recusando outras, mas sempre com o cuidado de explicar as suas decisões e de as transmitir com respeito por aqueles que as enviaram.

Esta prática foi, aliás, a mesma que o levou a deixar a Câmara de Cascais, entregando a herança do seu trabalho ao PSD e de, em linha com a decisão tomada pela Concelhia local do partido, apoiar e integrar a candidatura do partido em Sintra…

Mas o partido, esse que ele ajudou a criar e que sempre defendeu, já não se guiava pelos princípios de sempre e pela doutrina deixada por Sá Carneiro. A rectidão e a linearidade da sua prática, conjugada com a honestidade e a verdade que serviram de guia ao seu trabalho autárquico, chocavam de sobremaneira com os interesses instalados, com a prática suja que se havia institucionalizado e com um conjunto de gente que defendia ideias diferentes. Os novos dirigentes nacionais do partido, contrariando a vontade dos seus militantes de Sintra, os interesses de Sintra e dos Sintrenses e (pasme-se) até os interesses eleitorais do próprio PSD, decidiram pura e simplesmente anular a candidatura já anunciada e expulsar do partido aqueles que ousaram manter a rectidão da sua prática social-democrata.

Se, numa primeira perspectiva parece ser um problema interno do PSD, que deveria incomodar unicamente os militantes daquele partido e não a generalidade dos Portugueses, uma análise mais atenta permite verificar que o não é. Pelo contrário. Com a decisão que agora tomou, o PSD assume um paradigma de funcionamento assente em pressupostos que, dadas as responsabilidade que o partido teve, tem e terá ainda nos destinos de Portugal, extravasa de forma preocupante as suas fronteiras internas e implica gravemente no devir quotidiano dos Portugueses em geral.

Utilizando um guião de práticas que parece decalcado do que de pior se fez em Portugal há cem anos atrás, quando as eleições eram uma farsa na qual todos fingiam acreditar, a liberdade era uma utopia para artistas desolados e a democracia uma palavra vã que não servia para nada, o PSD voltou ao caciquismo trauliteiro que se rebola perante as revogações reiteradas das decisões irrevogáveis, sem laivo de vergonha, de princípios ou de confiança.

Este partido novo que agora governa Portugal, como infelizmente os restantes do dito arco do poder, vive encerrado sobre si próprio, sobre os seus líderes que fazem assentar o poder nos exércitos de apaniguados que se vão digladiando pelos lugares e pelas migalhas que o exercício rotativo do poder lhes vai deixando…

António Capucho já não cabe neste PSD, porque morreram as ideologias, os princípios, os valores, a educação e o respeito. Assuma-se que com eles também já morreu a liberdade e a democracia.

E se os Portugueses não forem capazes de lhes retirar o poder, vai morrer também Portugal.