O Estado da Anestesia em Portugal
João Aníbal Henriques, 17.11.14
por João Aníbal Henriques
Rebentou na última semana um dos maiores escândalos de sempre em Portugal. Com mais de uma dezena de envolvidos escolhidos de entre alguns dos mais altos funcionários do Estado, este escândalo mostra aos Portugueses um novo nível de corrupção, mais em linha com um qualquer romance de cordel do que com a triste história que actualmente caracteriza este país em que vivemos.
Infelizmente, depois do enredo que envolveu o mais escandaloso início de um ano lectivo em Portugal; da incrível estória protagonizada pelo Ministério da Justiça e dos seus inventados sabotadores encomendados que paralisaram os tribunais e a própria justiça durante muitas semanas; do extraordinário caso de falência do Grupo Espírito-Santo, com as incompreensíveis intervenções do Banco de Portugal, do Governo e do Presidente da República; da odorífera facada nas costas dada no líder do PS pelo seu correligionário socialista que ainda é presidente da Câmara Municipal de Lisboa; da cisão absurda e tremenda na já de si liderança bicéfala do Bloco de Esquerda; da maravilhosa estória da decisão irrevogável do Presidente do CDS; do abrasileirado escândalo da destruição da Portugal Telecom, acompanhado pelos prémios chorudos que foram dados aos que cavaram a sepultura daquela empresa estratégica para Portugal; de um Presidente da República que tibuteantemente mostrou não estar interessado em intervir directamente nos destinos do nosso Estado e de um Governo que assobia alegremente perante o descalabro geral que caracteriza Portugal, pouco ou nada resta para dizer, pensar ou discutir neste nosso desgraçado país…
A dose de irrealismo, que dantes se comparava ao caos que se instalou durante a primeira república mas que actualmente já o ultrapassou largamente, transformou Portugal numa espécie de grande arena de circo na qual tudo pode acontecer.
Já ninguém se espanta, nem ousa sequer criticar ou contrariar as desvairadas decisões de quem detém o poder. Para quê?...
E, se a nível estatal as coisas atingiram um descrédito que é transversal a todos os partidos e a todos os sectores de actividade, a nível local a situação não é diferente. Presidentes de câmaras legitimados pelos votos das eleições de 2013, põem e dispõem da coisa pública como se ela fizesse parte do seu pecúlio pessoal. Os balcões das empresas municipais, repletos de faces airosas oriundas das juventudes dos partidos onde trabalharam gratuitamente em troca de um emprego, são uma espécie de pastos onde a maralha divide o pouco que Portugal ainda consegue produzir.
E quem pode pensar em criticar esta gente? Ninguém! Pois se é tudo assim… se todos fazem o mesmo… se ninguém assume as consequências dos seus actos e se à boca cheia se regurgita a máxima de que quem não come é parvo!...
O certo, para alguém que ainda gosta de Portugal e que acredita que ainda é possível salvar a herança que recebemos dos nossos avós ao longo de mais de oito séculos, é que já pouco ou nada há a fazer. Pelo menos de dentro desta máquina de devastação onde os equilíbrios são precários e as dependências são transversais a toda a gente.
Entretanto, enquanto lá fora as estações vão passando, cruzando eleições futuras com os muitos interesses que todos sabem que dão forma ao nosso Estado, continuam um espectáculo deprimente que todos somos obrigados a ver e a financiar.
Os Portugueses estão anestesiados, incapazes até de reagir ao que no estão a fazer. E ainda bem que assim é! Porque senão seria insuportável a dor perante o desrespeito atroz perpetrado por esta gente.
Não vale a pena! The show must go on! Já não há nada que se possa fazer…