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A Rainha Dona Maria Pia em Cascais no dia 5 de Outubro de 1863

João Aníbal Henriques, 27.09.24

 

por João Aníbal Henriques

O dia 5 de Outubro de 1863 foi de festa em Cascais. Com pompa e circunstância, a baía encheu-se de salvas e vivas para receber a Princesa Dona Maria Pia de Sabóia que chegava nesse dia a Portugal para casar com o Rei Dom Luís I.

A vila, engalanada com as cores da Casa de Bragança, foi assim a primeira terra de Portugal a conhecer a futura rainha, mal sabendo ainda o quão importante ela haveria de ser para afirmar Cascais como a “Vila da Corte”, transformando-a com o seu requinte italiano no mais charmoso de todos os destinos em Portugal.

Em 1863 a então Princesa de Sabóia, com a frescura dos seus 15 anos de idade, chegou a bordo da corveta portuguesa Bartolomeu Dias, comandada por Francisco Soares Franco,  e transmitia a todos os que a rodearam o sentimento de esperança que trazia para o seu casamento real.

 

 

 

Mal sabia que, depois de uma vida de enganos e desenganos com o monarca seu marido, haveria de assistir à terrível morte de um filho e de um neto, sendo ela própria expulsa de Portugal.

Para além deste imenso desgosto, do qual nunca mais recuperou,  a Rainha Dona Maria Pia sofreu em Cascais um dos mais tenebrosos momentos da sua vida. Apesar das crises imensas que afectavam o casamento real, a rainha acompanhou o rei a Cascais quando este, já doente terminal, decidiu que queria morrer a olhar para as muito amadas águas da nossa baía. E não descansou quando, hora após hora, cuidou do seu marido ao longo da longa agonia que este haveria de sofrer na Cidadela Real.

O desgosto e o sofrimento foram tão grandes que depois da morte do rei decidiu que não queria voltar a entrar no Paço de Cascais. Esse espaço que se lhe tinha tornado maldito foi substituído pelo Chalet que havia adquirido no Monte Estoril e que partir desse momento passará a ser o sítio privilegiado para a reunião com os seus familiares e amigos numa espécie de corte secundária sempre que vinha a Cascais acompanhar a Família Real.

 

 

Quando morreu exilada em Itália, Dona Maria Pia pediu para ser sepultada com o rosto virado na direcção de Portugal, o país que apesar de tanto mal lhe ter infligido, era efectivamente a sua casa à qual devotadamente entregava o coração e a alma num gesto de amor que nunca foi reconhecido devidamente em Portugal.

Portugal deve muito a esta rainha e Cascais deve quase tudo o que fez deste lugar um sítio tão especial!

Convite para a Apresentação do Livro "O Outro Cascais" de João Aníbal Henriques

João Aníbal Henriques, 23.10.23
 

CONVITE

A Fundação Cascais, no âmbito do seu 30º Aniversário, com o alto patrocínio da Câmara Municipal de Cascais, vem convidar V. Exa. para a sessão de apresentação do livro "O OUTRO CASCAIS 30 Anos da Sociedade Civil e a Fundação Cascais" da autoria de João Aníbal Henriques que terá lugar no próximo dia 4 de Novembro, pelas 18:00h, no Salão Nobre da Câmara Municipal de Cascais, na Praça 5 de Outubro 1, 2750-320 Cascais

Apresentado o Livro "Viva Estoril" de João Aníbal Henriques

João Aníbal Henriques, 02.05.23

Apresentação do Livro "Viva Estoril" da autoria de João Aníbal Henriques e com Prefácio de Miguel Pinto Luz. Esta é a história extraordinária de António Simões de Almeida, António Pinto Coelho de Aguiar, António Teixeira Murta, Fernando Fernandes e Maurício Morais Barra que dá forma àquilo que é hoje a região de turismo de Cascais. 

 

 

(Imagens da Câmara Municipal de Cascais)

Apresentação do Livro "Viva Estoril" de João Aníbal Henriques

João Aníbal Henriques, 02.05.23

 

 

Numa iniciativa conjunta da ALA – Academia de Letras e Artes e da Associação de Turismo de Cascais, foi apresentado publicamente o livro “Viva Estoril” da autoria de João Aníbal Henriques e com prefácio de Miguel Pinto Luz. Abordando a história recente do turismo na Costa do Estoril, o livro recupera a história de um grupo de hoteleiros que tomou em mãos a recuperação do sector durante os anos conturbados que se seguiram à revolução de 25 de Abril de 1974 e do PREC. António Simões de Almeida, António Pinto Coelho de Aguiar, Maurício Morais Barra, Fernando Fernandes e António Teixeira Murta, a que mais tarde se juntaram Pedro Garcia, Luís Athayde, António Soares e muitos outros, foram os protagonistas de uma história que mudou radicalmente os destinos da região do Estoril e de Cascais até à actualidade.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Fotografias da autoria do Departamento de Comunicação da Câmara Municipal de Cascais e de Josefina Gonçalves

 

 

Convite para a Apresentação do Livro "Viva Estoril - Histórias da História do Turismo no Estoril (1974-1995)" - 28 de Abril - 18h30

João Aníbal Henriques, 19.04.23

 

 

No próximo dia 28 de Abril, às 18h15, no Posto de Turismo de Cascais (ao lado da câmara no antigo edifício dos bombeiros), vou apresentar o meu próximo livro intitulado “Viva Estoril”, com prefácio de Miguel Pinto Luz e chancela da ALA – Academia de Letras e Artes, numa cerimónia para a qual gostaria de vos convidar.

A história que partilho através das páginas deste livro é, porventura, a mais inesperada, surpreendente e extraordinária de todas as que já contei. Sobretudo para mim, que ando há muitas décadas literalmente mergulhado nas memórias vividas deste Cascais que tanto amo.

Foi protagonizada por um grupo de hoteleiros muito marcantes nesta região. António Aguiar, António Simões d’Almeida, Fernando Fernandes, Maurício Barra e António Teixeira Murta, aos quais mais tarde se juntaram Pedro Garcia, Luís Athayde, António Manuel Soares entre outros, literalmente reconverteram o Cascais de então, dando-lhe o carisma que hoje temos!

E a história que dá forma a esta História é de tal forma inesperada, surpreendente e inverosímil que nesta apresentação vamos igualmente entregar formalmente ao Arquivo Histórico Municipal de Cascais toda a documentação completamente inédita que suporta e comprova a total veracidade cada uma das afirmações, descrições, detalhes e relatos que ali faço.

De facto, numa década de 70 fustigada por sucessivas crises internacionais e pela revolução de Abril que praticamente implicou o fim do turismo a nível nacional, Cascais ia soçobrando perante as águas inquinadas das suas praias, pelo desinvestimento nos seus equipamentos e, sobretudo, pela diminuição radical e brusca dos seus fluxos turísticos.

Mas quando tudo parecia perdido, este grupo de jovens hoteleiros não baixou os braços e, perante um desafio imenso, enfrentou tudo e todos, provando que com vontade, determinação, foco e muita coragem, é possível inverter os cenários mais negros, reconstruindo toda a região e construindo o Cascais pujante e pleno de futuro onde hoje temos a sorte de poder viver.

Parece quase incrível que as maiores infraestruturas turísticas que hoje dão forma à nossa região tenham nascido da tenacidade empreendedora destes jovens. Mas foi exactamente assim que aconteceu. A marina, a ciclovia, o centro de congressos, a escola de hotelaria, o clube de ténis, as piscinas oceânicas, a autoestrada, o parque natural, o saneamento, etc. são apenas alguns dos feitos que nasceram dos feitos deles. Para não falar do windsurf no Guincho, do Grande Prémio do Estoril em F1, da criação da Fundação Cascais, do projecto de recuperação da cidadela e de muitos outros sonhos que eles tiveram o ensejo de concretizar e que hoje todos nós vivemos.

Fizeram-no afrontando os maiores poderes de então e conseguindo que a Concessão de Jogo do Casino Estoril voltasse a ser a mais relevante de todas as peças que dão forma à promoção da região.

Esta é uma História que me surpreendeu. Basicamente porque é surpreendente! E, também por isso, é para mim uma enorme honra esta oportunidade que tive de poder contribuir para a eternizar junto da memória dos Cascalenses. Porque é justo que assim seja. Porque é uma lição que fica perante os desafios também imensos que surgem agora no horizonte das vidas dos meus filhos e das gerações que se seguirão à deles.

Conto convosco no próximo dia 28 de Abril. Porque Cascais é mesmo o recanto mais extraordinário de Portugal!

João Aníbal Henriques

Versão em PDF do Livro "Viva Estoril": AQUI

 

 

 

 

 

Fortaleza de Nossa Senhora da Luz em Cascais

João Aníbal Henriques, 21.06.21
A Fortaleza de Nossa Senhora da Luz e a Torre de Santo António, em Cascais, reabriram ao público no passado dia 13 de Junho para visitação. O monumento, porventura o mais antigo e importante marco da História de Cascais, está na posse do Estado central encontrando-se fechado desde meados da década de 80 do século passado e num estado galopante de degradação. Com esta abertura simbólica ao público, a Câmara Municipal de Cascais permitiu que um grupo de Cascalenses pudesse conhecer e visitar o espaço, através de uma animação histórica protagonizada pela arqueóloga Vera Cardoso. 


Memórias do Turismo em Cascais com António Aguiar

João Aníbal Henriques, 21.06.21
O turismo é a vocação primordial de Cascais. Desde 1870, quando a Corte escolheu Cascais para o seu veraneio, que a vila se tem organizado em torno do imenso desafio que representa a criação daquele que é o mais excelente destino turístico do Sul da Europa. Nesta "Conversa de Cascais", tendo a Fortaleza de Nossa Senhora da Luz como cenário, João Aníbal Henriques conversa com António Pinto Coelho d'Aguiar, relembrando episódio impactantes passados nos principais hotéis da região durante o período difícil da revolução de 1974...


A Aldeia Nova de Cascais no Alto da Bela Vista

João Aníbal Henriques, 21.03.20
 

 

 
O Cascais que conhecemos e em que hoje vivemos, resultante das grandes alterações havidas na vila a partir do último quartel do Século XIX quando o Rei Dom Luís escolheu este espaço como destino privilegiado de veraneio, esconde de forma literal todo um enquadramento histórico que deriva do processo natural de nascimento, crescimento e afirmação da urbe no contexto nacional. O Alto da Bela Vista é exemplo paradigmático desta situação, pois reúne em si mesmo um conjunto de memórias consubstanciadas em património urbano de primeira importância para Cascais, que ficou encoberto pela assimilação daquele espaço pelo perímetro histórico consolidado da vila que agora temos. Conhecer a génese histórico/urbanística do Alto da Bela Vista é, desta forma, um importante contributo para a recuperação da Memória Histórica e, por extensão, da Identidade Municipal de Cascais, reafirmando a capacidade de enquadramento dos projectos que surjam para aquele local e potenciando o seu valor enquanto factores consolidadores da cidadania local.

 

 
por João Aníbal Henriques 
 
 
 
 
A Génese do Espaço e as Memórias de Cascais
 
Ninguém sabe, de forma efectiva, onde Cascais nasceu. A urbe que hoje temos, tradicionalmente marcada pelo epíteto de “Vila de Reis e de Pescadores”, é o resultado efectivo de um enorme conjunto de acontecimentos que por aqui se desenvolveram ao longo dos séculos.
 
Sabendo-se que a ligação de Cascais ao mar é realidade inata à própria existência de aglomerados habitacionais neste espaço, o certo é que a ligação da vila aos seus ilustres pescadores nem sempre se desenhou a partir dos cenários que hoje conhecemos.
 
Nos primórdios da existência humana em Cascais, quando as primeiras comunidades deambulavam em busca de segurança e alimento, o espaço agora ocupado pela vila oferecia condições excepcionais de habitabilidade.
 
O mar, fonte praticamente inesgotável de alimentos, assegurava praticamente ao longo de todo o ano, o sustento necessário à sobrevivência humana. E, se o clima e a paisagem eram (e são cada vez mais) paradisíacos, faltava assegurar somente uma dessas componentes básicas que dão sustento a existência de comunidades humanas: o abrigo e a segurança perante ataques e intempéries.
 
Mas neste campo, possivelmente diferenciando Cascais das demais enseadas arenosas e desérticas que abundavam na região, possui no seu subsolo um conjunto de grutas e cavidades que, furando a pedra calcária que dá forma ao nosso solo, formam um vasto complexo de cavernas que apresentavam excelentes condições de acesso e habitabilidade.
 
 
 
 
Torna-se fácil perceber, desta maneira, a razão de ser de ter sido provavelmente nas actuais Grutas do Poço Velho, situadas no sopé do morro da Bela Vista, que Cascais nasceu efectivamente. E de, nesses tempos imemoriais do Paleolítico, terem sido ocupadas por caçadores-recolectores que naturalmente utilizavam o mar como sua fonte principal de alimentos.
 
Cascais nasceu ali, há dezenas de milhares de anos atrás, a partir do binómio que ainda corporiza o inconsciente colectivo da grande maioria dos Cascalenses: o Sol e o Mar, definindo na sua lógica de desenvolvimento urbano uma componente que vincula ambas as realidades perante a necessidade maior de oferecer qualidade de vida a todos os seres humanos que ali se instalaram e que escolheram este como o local ideal para viver.
 
Suficientemente afastadas do mar para poderem salvaguardar a segurança desejada mas, ao mesmo tempo, próximas o suficiente para serem acessíveis no labor quotidiano, foi no espaço das Grutas do Poço Velho que nasceram as primeiras comunidades piscatórias locais. Foi também ali, a partir dos pressupostos atrás elencados, que nasceram e se criaram as técnicas, as práticas e os conhecimentos que aproximam Cascais do mar até à actualidade.
 
A consolidação e a sedentarização destas primeiras comunidades humanas na génese do território Cascalense inicia então um processo de paulatina aproximação física ao mar e às praias. O desenvolvimento de conhecimentos na área das construções e a pacificação que resultou do processo de Neolitização, tornou possível virar costas aos abrigos naturais proporcionados pelas grutas e optar por formas de abrigo mais precárias e melhor posicionadas relativamente ao mar. Nascem assim os primeiro aglomerados pré-urbanos, possivelmente localizados em torno da Baía de Cascais, a partir da construção de casas feitas com materiais perecíveis e cujos vestígios não chegaram naturalmente até à actualidade.
 
Na época Romana, na qual a urbanidade já tinha atingido outros níveis de conhecimento, já encontramos vestígios arqueológicos de ocupação humana na actual zona do castelo, de cara voltada para o mar mas ainda assim aproveitando o desnível do terreno para assegurar alguma segurança suplementar (ver as Cetárias Romanas situadas na Rua Marques Leal Pancada), ao mesmo tempo que o espaço antigo das velhas grutas de outros tempos vai ficando olvidado.
 
 
 
 
 
Durante muitos séculos a vida de Cascais recentrou-se em volta da Baía. Era ali que se situavam as velhas cabanas abarracadas onde pernoitavam os pescadores que aqui chegavam, era também ali que se situavam as indústrias de salga e conserva de peixe que tornaram próspero o lugar.
 
Utilização e Usufruto
 
Mas como nada é linear na História de Cascais, importa perceber que a concentração de esforços e o assentamento das primeiras comunidades na actual zona junto ao mar, não representou necessariamente o abandono dos velhos espaços. Pelo contrário.
 
Nas Grutas do Poço Velho e, de forma muito progressiva nas encostas do morro da Bela Vista, foram ficando pequenas comunidades humanas que trabalhavam e rentabilizavam esses espaços.
 
A primeira notícia que temos desta realidade situa-se precisamente junto à entrada nas Grutas do Poço Velho numa das ruas que dá acesso às mesmas para quem vinha da zona saloia situada no triângulo verdejante e próspero que liga a Serra de Sintra ao mar. Na pequeníssima e quase desconhecida Capela de Nossa da Conceição de Porto Seguro, está ainda hoje uma placa votiva que refere que o templo e o hospício que lhe estava anexo foi construído em 1691por Paschoal Dias e Maria da Costa, originários de Oeiras e que ofereceram esse espaço aos Frades Capuchos  de Santa Cruz da Serra de Sintra.
 
E por ali, contrariamente ao que hoje se sabe, consolidou-se um núcleo de povoamento dependente do apoio social proporcionado pelo hospício e, concomitantemente, pelo amparo espiritual da invocação maior que Nossa Senhora da Conceição represente em Cascais e em Portugal…
 
 
 
 
De tal forma foi importante esse povoamento do local, demonstrando a documentação existente que houve efectivamente um afastamento real entre esse espaço e o da consolidação urbanística da Vila de Cascais e seus arrabaldes, que já no Século XIX, quando a Corte escolhe a vila como estância de veraneio, Francisco Marques Leal Pancada, um benemérito Cascalense também relacionado profissionalmente com a conservação do peixe, adquire a capela e o hospício e efectua amplas obras de conservação e restauro.
 
É importante não esquecer que foi precisamente Leal Pancada que, tempos depois, oferece à população de Cascais o terreno onde virá a ser construído o Hospital dos Condes de Castro Guimarães, situado mesmo em frente ao local onde se situava o Campo Santo e o cemitério principal da localidade.


 
 

A Vila Nova de Cascais, por ironia do destino localizada precisamente sobre o local onde Cascais nasceu, cresceu assim com uma dinâmica própria e a pujança de um local que detinha meios próprios de subsistência. Sendo um arrabalde da vila propriamente dita, preservou a sua identidade e consolidou a sua importância no crescimento e consolidação geral da vida Cascalense.
 
Memórias e Identidade
 
Na caracterização da unidade urbanística que resulta do devir histórico da Aldeia Nova de Cascais e do próprio Alto da Bela Vista, importa recuperar muita da informação presente no “Levantamento Exaustivo do Património Cascalense” (Fundação Cascais: 2000) onde se elencavam cada casa e cada detalhe com relevância para a compreensão deste importante núcleo Cascalense.


 
 
As peças que hoje restam, para além do aglomerado habitacional que foi sendo construído a partir da criação do velho hospício e da Capela de Porto Seguro, ambos peças-chave para compreender e contextualizar eventuais intervenções futuras a realizar naquele espaço, cingem-se tão somente aos detalhes arquitectónicos que sobreviveram às agruras impostas pelos novos tempos e pelas novas necessidades. As cantarias das portas e das janelas, muitas delas com decoração singela em memória de realidades que não existem já, foram reutilizadas em processos de demolição e reconstrução sucessivas que por ali se foram fazendo. E na divisão dos lotes, mesmo com as contrariedades impostas pelo emparcelamento, ainda é possível encontrar os vestígios daquele que foi o Cascais primordial de outros tempos, com as suas courelas e pequenas quintas, os velhos currais de gado e até as actividades de apoio à vida quotidiana no coração da vila.


 
 
Esta vertente “saloia” da Aldeia Nova, o local onde se produzia muito daquilo que se consumia na vila de então, foi-se consolidando com o desenvolvimento industrial. Em primeiro lugar, logo ali ao lado, a Real Fábrica de Lanifícios de Cascais e, mais adiante, a Fábrica de Conservas de Peixe que ajudou a definir a margem direita da ribeira. O hospício, que entretanto foi evoluindo para um verdadeiro hospital (e cujo edifício ainda lá se encontra transformado em espaço residencial), era destino eminente para os mais pobres e desfavorecidos da sociedade de então. Convergiriam para ali os que tinham menos posses e meios, sendo certo que pescadores e mareantes ali encontravam o consolo físico e espiritual para os males que os afectavam.
 
Será eventualmente por isso que, a título de explicação, se mantém a ligação perene entre o mar e este arrabalde “longínquo” do centro de Cascais onde, aliás, se situava o cemitério onde encontravam os pescadores o seu eterno descanso. Possivelmente por isso igualmente, e parecendo pôr em causa toda a lógica e discernimento, ali é construído em época mais recente o “Bairro de Nossa Senhora dos Navegantes” (vulgo Bairro dos Pescadores) que, até há muito pouco tempo era cenário de velhos barcos esventrados ou em operações de reconstrução, pousados em pequenos terrenos cheios de redes e apetrechos velhos de pesca.


 
 
Enquadramento Urbanístico
 
A apreciação de operações urbanísticas neste espaço, natural por sabermos que o envelhecimento do espaço determina necessariamente a sua recuperação, actualização e modernização, deveria ter em conta esta identidade própria do Alto da Bela Vista e a sua importância efectiva na definição daquilo que ainda hoje é Cascais.
 
O enquadramento dos futuros projectos nesta realidade, bem como a rentabilização das memórias patrimoniais que ali subsistem, ajuda a qualificar as intervenções e, desta forma, consolida a Identidade Municipal e promove a memória colectiva.
 
Interpretar desta maneira a realidade que temos em linha com as pré-existências dos diversos lugares, assegura aos que projectam nos mesmos condições ímpares para reforçarem igualmente a sua atractividade e, por extensão natural, o valor intrínseco dos empreendimentos e espaços.
 
Por esse motivo ganha redobrada importância a proposta de requalificação do edifício situado na Rua da Bela Vista, cuja Certidão Urbanística foi discutida na última reunião de Câmara. Toda e qualquer intervenção efectuada no âmbito do contexto urbanístico e patrimonial que seja sinónimo de melhoria da qualidade dos edifícios, e que o faça sem desvirtuar o seu enquadramento genérico na realidade local, é contributo decisivo para o reforço da vocação turística municipal, sendo que esta, conforme está plasmado no próprio Plano Director Municipal, deverá ser resultando de um acréscimo na identidade dos moradores e frequentadores do local.


 
 
O potencial educativo e pedagógico do Alto da Bela Vista, tal como acontece em tantos outros cantos e recantos de Cascais, é imenso. É ali que reside a possibilidade de as novas gerações criarem laços e vínculos perenes com quem os antecedeu na ocupação deste espaço. Só assim, com esses laços bem evidentes e com uma abordagem politicamente consciente desta importância, será possível fazer crescer Cascais com qualidade, motivando os equilíbrios sociais com as necessidades de prosperidade e empreendedorismo, e zelando por um reforço efectivo da Identidade Municipal, essencial para uma cidadania consciente e, em última instância, para uma democracia saudável.


 
 
Conclusão
 
A Aldeia Nova de Cascais é uma realidade desconhecida de quase toda a gente. E esse facto, associado aos naturais processos de rejuvenescimento dos nossos espaços habitacionais consolidados, acaba por fazer perder potencialidades que um conhecimento enquadratório daquela realidade almejaria alcançar.
 
Compreender a razão de ser daquele espaço, os motivos que levaram a que tivesse chegado até nós com as características que nele reconhecemos e as potencialidades imensas que possui para a definição da qualidade que todos desejemos para Cascais, ajuda os técnicos que formulam e apreciam os projectos para aquele lugar, os professores e educadores das escolas locais, os políticos que decidem os destinos da nossa terra, e até o cidadão comum que pretende construir ali (ou reconstruir) a sua casa, a tomar as decisões que melhor correspondem aos interesses de todos os Cascalenses.
 
Porque sem consciência de quem somos, de onde viemos e para onde vamos, as discussões acabam naturalmente por perder-se nos interesses mais mesquinhos e imediatos, delas resultando pouco mais do que uma pequena peça na engrenagem imensa com que o sistema político que temos nos constrange.
 
 
Porque como dizia Pedro Falcão no seu “Cascais Menino”, este é “o Cascais com que sonhamos”. 
 
 

O Forte das Velas na Praia do Abano em Cascais

João Aníbal Henriques, 17.12.18

 

 
 
por João Aníbal Henriques
 
Só existe um adjectivo com a abrangência suficiente para descrever de forma capaz o popularmente designado Forte do Abano, situado a Norte da Praia do Guincho, em pleno Parque Natural Sintra-Cascais: incrível!
 
Sendo um momento singelo de raiz militar, semelhante tipologicamente a tantos outros existentes ao longo da nossa linha de costa e construído especificamente para garantir a segurança do território Nacional perante eventuais investidas marítimas dos nossos muitos inimigos, é único na sua relação com o espaço e com o enquadramento cénico que lhe dá forma.
 
 

 

 
 
A sua localização, num promontório rochoso entre as Praias do Guincho e do Abano, plena e permanentemente fustigado pela fúria das ondas do mar e pelo vento que chega agreste e forte vindo da Serra de Sintra, confere-lhe um impacto sem par na paisagem. À sua volta, no contraste permanente entre o azul do mar, o branco das nuvens e o verde forte das encostas que dali seguem até à Peninha, a vista alonga-se através de um dos mais inesquecíveis cenários do Concelho de Cascais, potenciando a sua presença e reforçando a sua importância estratégica na definição da vocação turística municipal.
 
Incrível também porque, até contextualizando o monumento na sua mera função figurativa enquanto esteio promocional do turismo desta região, o estado deplorável de abandono, vandalismo latente e degradação acentuada, representa um autêntico atentado ao património de Cascais, dos Cascalenses e mesmo de Portugal.
 
 
 
É totalmente inconcebível que num país como Portugal e num Concelho como o de Cascais, nos quais a projecção da importância do sector turístico é tão grande, seja possível deixar que desleixadamente este tipo de equipamentos se vá perdendo por incúria, desleixo e desinteresse das entidades públicas,  perdendo não só todo o valor cultural que a ele está inerente, como também todo o enorme conjunto de potencialidades económicas, empresariais, culturais, patrimoniais, educativas e outras que o mesmo apresenta. É inconcebível e intolerável que o Estado Português, responsável tutelar pela salvaguarda dos valores que os Portugueses lhe deram à guarda, permita que este tipo de peças patrimoniais chegue a este estado de abandono, não efectuando sequer o mínimo esforço para garantir que os mesmos estão fechados e inacessíveis aos vândalos que os vão degradando.
 
 
 
E infelizmente, este não é caso único, nem singular em Cascais e em Portugal! Intolerável e incrível!
O Forte das Velas, sendo peça integrante no esforço efectuado depois da Restauração da Independência Nacional em 1640, faz parte de um complexo de vários fortes que cruzavam fogo sobre as principais enseadas marítimas de Cascais, recriando uma cortina que visava impedir desembarques indesejados nas principais praias do concelho.
 
 

 

 

 
 
Com a volumetria tradicional da sua época, o também designado Forte do Abano foi construído em 1642 por ordem de D. António Luís de Castro, Conde de Cantanhede e Governador da Praça de Cascais, e inicialmente guarnecido por sete peças de artilharia pesada.
 
Classificado como Imóvel de Interesse Público através do Decreto 129/77, de Setembro de 1977, foi alvo de várias obras de requalificação e adaptação ao longo dos anos, que lhe conferiram o aspecto que hoje apresenta.
 
Na componente de alojamento, teria inicialmente três corpos cobertos virados a Este, protegidos da força do mar pelo terraço onde se instalava o grosso da artilharia, e terá sido reformado em meados do Século XIX, quando o desenvolvimento de novas técnicas militares possibilitou a libertação de algum do espaço de aquartelamento, perdendo o corpo central que foi substituído por um pequeno terraço a céu aberto e pela nova cisterna de captação de água corrente.
 
 
 
 
Da estrutura inicial são ainda de salientar as duas chaminés de aquecimento dos corpos de alojamento situados junto à entrada, vandalizadas possivelmente de forma irrecuperável em época recente, bem como a estrutura de transporte e captação das águas para o seu espaço de armazenamento.
 
Com o enquadramento cénico único propiciado pelo espaço onde se encontra, o Forte das Velas é uma das peças patrimoniais que mais interesse desperta junto dos muitos milhares de veraneantes e passeantes que frequentam a Praia do Guincho, que quase sempre sobem o espaço da encosta para o observar mais de perto.
 
 
 
 
Sobre a porta da entrada, praticamente ilegível debaixo do Escudo de Armas Português, a placa comemorativa da sua inauguração desperta o gracejo dos que o visitam. Em acentuada degradação e em estado de ruína eminente, é simultaneamente um tesouro precioso e um perigo imenso, com a acessibilidade privilegiada que tem cruzada com a falta de controle de quem por ali transita.
 
Resta pouco tempo de vida ao Forte das Velas. Até porque para além do vandalismo a que está sujeito quotidianamente, os próprios elementos se encarregam de o ir destruindo.
 
Com o seu desaparecimento e paulatina degradação perde Cascais, perdem os Cascalenses e todos os Portugueses. Incrível que seja assim!
 
 

A Via-Rápida de Cascais: Vícios Suburbanos numa vila (ainda) especial...

João Aníbal Henriques, 26.04.17

 

 
 
A inauguração do CascaisVilla, em Novembro de 2001, representou o culminar de uma verdadeira revolução urbanística em Cascais. A substituição da antiga Rua Padre Moysés da Silva, com os seus saudosos relvados sempre bem cuidados, pela nova Avenida Dom Pedro I, com o seu perfil de via rápida em pleno coração da vila, inverteu por completo a urbanidade de Cascais, transformando drasticamente a velha e charmosa urbe em mais um moderno e incaracterístico subúrbio de Lisboa.
 
A nova porta de Cascais, encabeçada pelo popularíssimo “Titanic”, foi projectada para facilitar a entrada de automóveis na vila, deixando para segundo plano as preocupações com os peões e com o carácter antigo desta vila tão especial. As quatro filas de trânsito paralelas, atravessadas somente por quatro míseras passadeiras de peões, promovem a velocidade automóvel e dividem literalmente a velha povoação em duas partes desiguais.
 
Os semáforos foram pensados para deixar os nervos em franja a qualquer incauto passeante. O intolerável tempo de espera para os peões, aliado à falta de sincronização entre as passagens, faz com que a travessia da avenida demore tanto tempo que a maior parte das pessoas acaba por corajosamente atravessar com sinal encarnado pelo meio dos carros. Quando colocados perante a morosidade dos semáforos, os estrangeiros que ali chegam pela primeira vez e todos aqueles que não conhecem este pesadelo suburbano de Cascais, concluem geralmente que estes estão avariados e também eles empreendem a perigosa passagem…
 
E como se tal não fosse suficiente, decidiu-se juntar à confusão uma espécie atabalhoada de central de camionagem que, localizada no piso inferior do centro comercial, usufrui de um acesso literalmente encaixado à força e de forma abastardada no projecto inicial, criando uma zona de trânsito semi-condicionado e muito inseguro que poucos percebem e que ajuda a fomentar a precariedade de todo o espaço.
 
 
 
 
Mas, não bastando o carácter inusitado de toda esta situação, o recém-aprovado PDM de Cascais, ainda promove o agravamento da situação (Ver AQUI). Os parâmetros urbanísticos previstos para este local, ao invés de reverterem a situação e de devolverem a Cascais a dignidade urbana própria que a vila merece, multiplicam este carácter suburbano, potenciando o aumento da construção.
 
Poder-se-ia dizer que toda esta situação poderia ser facilmente resolvida a bem de Cascais e da sua população. E é verdade. Mas, embora as críticas sejam muitas e o rebuliço partidário se acenda a cada 4 anos, o certo é que ninguém ousou fazer as coisas de maneira diferente.
 
A Vila de Cascais, que durante muitas décadas foi local de charme e de reconhecida qualidade urbana e comercial, vem-se transformando aos poucos em mais um subúrbio desinteressante e incaracterístico de Lisboa. Os danos colaterais, bem visíveis no paulatino desaparecimento do comércio tradicional e no aumento da insegurança urbana, afectam a qualidade de vida de todos os Cascalenses, comprometendo a vocação turística municipal.
 
Mas, ao que parece, é mesmo esta a infeliz opção…  
 
 
 
 
Passadeiras? Para peões?...
 
As quatro passagens de peões existentes nesta via-rápida são insuficientes e foram desenhadas para potenciar o tráfego automóvel. O tempo de espera para peões, agravado com a falta de sincronização das mesmas, faz com que para muitos a única opção seja o atravessamento com luz encarnada, pondo em risco a sua vida e a daqueles que circulam nos carros. É intolerável!